29 de setembro de 2020

Finda, Maria e o passarinho



Finda abaixou-se para observar melhor um pequeno pássaro de barriga para cima, o peito amarelado, a penugem em volta preta. As perninhas inertes, os olhos fechados, o bico entreaberto. O sol começava a ganhar intensidade, outros passarinhos cantavam, o vento balançava as folhas das árvores. O que havia de errado com aquele passarinho perto dos seus pés? Resolveu tocar-lhe para observar a reação. O resultado? O pequeno ser abriu os olhinhos e piscou algumas vezes. A respiração ganhou intensidade. Por que não se vira? Por que não se mexe? Pensou a criança, tentando entender aquele momento. 

O passarinho fechou os olhos novamente, mas a respiração continuava intensa. Finda o pegou com as mãos sem que houvesse reação. Mexeu na cabecinha do passarinho, mas ele não abriu os olhos. É como uma canseira demasiada, um susto que não passa, uma quietude agonizante. Um sofrer sozinho, mesmo que tenha alguém lhe observando. O que vem depois? O que vai acontecer quando ele parar de vez? A garotinha refletia sobre isso quando o pássaro mexeu levemente uma das asas em suas mãos. Ela prestou mais atenção, talvez ele pudesse reagir… 

O pequeno ser alado mexeu a outra asa, os pés. Abriu os olhos e pareceu fitar quem o tinha nas mãos. Finda retribuiu o olhar com um sorriso, satisfeita. Com delicadeza colocou-o em pé sobre as mãos e fez-lhe um carinho na cabeça. O bichinho pareceu se agradar ao fechar os olhinhos. 

— Agora que parece melhor, eu vou te deixar no chão. Vou procurar água para que beba e ganhe forças para voar.

A menininha afastou-se saltitante. Seu vestido de renda branco sem detalhes chacoalhava pelo caminho até a fonte no pátio do castelo. Os pés descalços encostaram na beirada circular enquanto ela esquadrinhava o local em busca de um recipiente. Do outro lado da fonte ela identificou sua irmã. 

— O que está procurando? — perguntou-lhe Maria.

— Um recipiente para água.

— Para quê?

— Um pássaro que está doente.

— Vi outros assim. Água não vai curá-lo…

— Não acredito em você.

— Pois bem, tome, leve esta vasilha de cerâmica que eu estava usando para brincar. Depois não diga que eu não avisei…

— Obrigada.

Finda debruçou-se sobre a fonte para encher a pequena vasilha cedida por sua irmã, mas se desequilibrou e caiu. Debateu-se sobre a água sem saber nadar, afundando, pedindo socorro. Um soldado ouviu os gritos, outros foram chamados por Maria, sendo que ao final o socorro veio a tempo. Os homens do rei Mario, no entanto, não permitiram que Finda continuasse a brincar por ali mesmo sob intenso protesto da garotinha. Ela tinha que voltar ao pássaro, levar-lhe água. Os homens fardados diziam que ela deveria descansar e se afastar do perigo; que estava molhada e necessitava de um banho e que os soberanos não os perdoariam se soubessem do incidente de afogamento.  

— Não se preocupe, eu faço em seu lugar — disse Maria à irmã.

Demorou um tempo para Maria identificar o local em que o passarinho estaria, de acordo com Finda. Ao identificar a localidade, portando a água na pequena cumbuca, Maria soube que chegara tarde demais. O serzinho alado estava encolhidinho, imóvel. Faltava-lhe algo importante. Para se certificar, mexeu com ele, mas nada aconteceu. O bichinho estava rígido como alguns outros pássaros que ela já tinha visto por aí. 

Maria, então, esvaziou sua vasilha. Pegou o passarinho com as mãos e se afastou dali, pensando que a irmã ficaria muito triste em vê-lo daquela maneira. Sua ideia foi a de cavar um pequeno buraco e enterrar o bichinho. 

Mais tarde, já podendo deixar os cuidados dos soldados Finda correu para ver o passarinho ou ter notícias do caso com a irmã. Ao chegar no local, no entanto, não encontrou o bichinho. Viu apenas a vasilha vazia. 

— Ele não está mais aí — era Maria chegando com o vestido sujo de terra na altura das coxas.

— Não me diga que…

— Ele voou, foi embora. Joguei a água fora e fui brincar na terra.

15 de setembro de 2020

Acordei com você na cabeça


Paz, como deve notar pelo título, encontrei a música que me sugeriu. Ouvi por diversas vezes e acho que até a decorei. Se gostei? Eu diria que sim, mas o meu gosto foi influenciado por sua sugestão, então não sei se vale. “Tudo no mundo me lembra você”, já pensou nessa frase da música? Eu fiquei pensando e deduzi que faz muito sentido. Entenda aí o que eu quis dizer…

Ah, sobre Geografia, realmente se trata dos temas que você mencionou. Só que tem muitos outros também. Clima, vegetação, por exemplo. O que mais me agrada na matéria que leciono é mesmo o fator espacial. O lugar das coisas, sabe? Em Geografia tem muito disso. Saberia me dizer o seu lugar no mundo? Usaria longitude e latitude para isso? Tem outros meios também: que tal me passar o seu endereço, em vez de uma Caixa Postal?

Resumindo, a Geografia serve para acharmos lugares e pessoas.

Sobre mapas eu não passo este tipo de tarefa aos meus alunos. Isto está ultrapassado, mas não vou entrar em detalhes. Acho que aprendi minha lição com o Youtube, não é?

Ei, minhas perguntas não são esquisitas! Apagar o sol quando ninguém está vendo é muito normal, não é?

De todo modo, vou falar um pouco de mim. Sou professor, moro sozinho e trabalho muito. Sei cozinhar o básico, mas poucas vezes me atrevo a pilotar o fogão (o convite para comer suas batatas está aceito, viu). Nas horas vagas leio e escrevo. O meu gosto pela leitura é bem variado, Filosofia, Romance, Biografia e Poesia.

Apenas saio de casa para trabalhar. Tenho alguns amigos que visito de vez em quando. Minha família mora na cidade em que resido e os vejo às vezes. Tenho pai, mãe e uma irmã. Ah, raramente fico doente! Nem gripe, acredita? Não sou gordo nem magro, detesto exercícios físicos e bebo socialmente. A minha barba é rala e meu cabelo grosso. Tenho improvisar penterados, mas ficam horríveis, então corto bem curtinho. Pra falar a verdade, não sei se alguém repara em mim.

Aliás, que tipo de trabalho você faz aí?

Fiquei te imaginando vestida com a roupa nova que comprou. Não é um pensamento erótico, nem nada disso. É só imaginação mesmo… Eu te vejo com o lindo vestido vermelho caminhando em uma estrada qualquer. Minha visão é de longe, mas sei que é você. O tempo está fresco, venta. Acho que vai chover, o que me diz? 

Vou ficando por aqui, aguardando ansiosamente sua resposta.