28 de junho de 2018

O oitavo capítulo de V de Verônica já foi publicado



Acabo de atualizar o livro "V de Verônica" com o capítulo oito. Você pode lê-lo clicando aqui e acompanhar toda a história por este link:

https://www.wattpad.com/story/142350685-v-de-ver%C3%B4nica/parts

O livro no Issuu está assim:

Fique de olho para conferir novas atualizações.
Abraço!

25 de junho de 2018

Futuro Seguro


O prazo para Willian Nascimento aderir ao Seguro estava no fim. Deveria assinar o contrato como todo ser que pretendia sobreviver naqueles dias caóticos e egoístas. Entretanto, tem um detalhe que o impede de fechar o negócio: Willian é pobre, esta é a primeira característica deste protagonista. Tal atributo, é preciso dizer, encarecia ainda mais os valores em questão.
Não é segredo que a Seguradora trouxe conforto à população. Entenda, naquele tempo a noção de conforto é diferente da que conhecemos hoje. Para Willian e sua geração conforto é o mesmo que segurança. Isto mesmo, sentir-se protegido, deitar-se em uma cama e ter um sono tranquilo; parar o seu veículo em um local público e encontrá-lo ali ao voltar de um compromisso; a sensação de ter um companheiro fiel; a impressão de que tudo está bem.
O jovem Nascimento, desculpem-me pelo trocadilho infame, nascia cada dia sem a certeza do amanhecer seguinte e não possuía, como é de se esperar, conforto ou segurança, chame do que melhor lhe convier. 
— Willian, não perca esta promoção: adquira já o Seguro Flamejante por apenas 13 mil unidades anuais e evite situações como esta.  
Aquela mulher, cujas feições pertenciam a quem o jovem idealizava como par prefeito, mas que não era humana, tornara-se constante na vida do rapaz; na existência de todos desde os primeiros anos, coisa normal para eles. Em palavras simples, A Sys é uma assistente pessoal onisciente da Seguradora com o objetivo de vender seguros. Ainda complicado? Bem, tente imaginar seu celular sendo uma pessoa de verdade, visível apenas por você, mas totalmente personalizável.   
 Foi engraçado como Willian viu Sys pela primeira vez, numa praça pública aos seis anos de idade. Ela materializou-se para ele como uma criança da sua idade, ofereceu-lhe sorvete, brincaram juntos.  Ao final ela disse a ele:
— Se fizer o seguro poderemos brincar todos os dias.
Willian pediu ao pai que lhe desse este presente, mas Lauro Nascimento não tinha condições. Homem de quarenta e poucos anos, trabalhador braçal e viúvo, ele mesmo não era um segurado e acabou perdendo a vida, aos cinquenta e cinco anos, numa tarde de verão ao sair das dependências da obra em que vinha trabalhando. 
Voltando ao presente e ao trocadilho infame do qual não me orgulho, pois estou ciente de que tratar-se já de um momento decisivo para Willian. O nosso jovem está encurralado por dois estudantes de idade pareada a dele. O diferencial e aqui vem a questão social de toda esta história, consiste no seguro. Ambos, como é de se esperar, são segurados. 
— Então, pobre, últimas palavras? 
Definindo melhor o momento, Willian está no chão desde que comecei a narrar esta história. Ele caiu depois de levar um soco de um dos garotos estudantes. O nome do agressor é Narciso e o seu seguro é de espécie denominada Hipotérmico um dos mais baratos, cuja principal característica é conferir ao seu usuário a capacidade de causar hipotermia em outros corpos pelo toque. Narciso, além de querer testar a potência de sua proteção securitária, deseja limpar o bairro de pessoas como Willian. 
O seu companheiro, calado, um pouco obeso, é mais cauteloso:
— Larga mão, cara. Vamos pra escola, anda!
— Para de ser cagão, Israel. Pobre tem que morrer. 
— Eu sei, mas não vale o nosso atraso. Que ser suspenso?
O soco gelado de Narciso pegou Willian de surpresa porque antes de eu começar a contar sua história ele estava pedindo à Sys (mais uma vez) uma amostra gratuita de qualquer seguro, apenas para se ver livre daquele inconveniente. A resposta daquela vez? Vejam:
— Não, Willian. Você quer me fazer de boba! Que história vai inventar agora? Pai doente, mãe presa, irmão político? Posso relembrar todas se preferir, está tudo gravado no meu banco de dados. Se bem que, não temos tempo para isso...
— Dessa vez é sério, Sys. Eu sei que preciso da proteção definitiva, mas ainda estou indeciso sobre o tipo. Mande-me o de choque, que tal? 
— Cuidado! 
— O que?
O soco.
Willian leva os dedos aos lábios, a sensação não é nova. A mão gelada de Narciso em seu nariz, olho, lábios, por quantas vezes? Sys poderia dizer, mas a assistente não se mantém ativa naquele momento. O que as assistentes dos agressores sussurram para eles? Mate, Bata, Defenda-se. É irônico que a palavra defesa seja interpretada de maneira errônea e signifique justamente o inverso. Irônico, mas comum. 
— Por que não escuta o seu amigo? — Willian indaga a Narciso. — Eu não sou alguém que valha a pena. 
Nosso Willian tem mesmo razão, ele reúne poucas características que fazem jus ao seu papel nesta trama. Conta com dezenove anos de vida, nenhuma instrução acadêmica, um barraco herdado e uma mochila equipada com sua marmita que será sua única refeição para aquele dia. Bem, vejam pelo lado bom: se ele morrer agora, não passará fome mais tarde.  Ao perder o pai, seu único parente vivo, substitui-o na construção, sendo que ia para lá quando foi atacado pelos infames estudantes. Se podemos, então, definir uma habilidade ao nosso homem, seria a de construir imóveis. Sim, Willian é um pedreiro, ofício que aprendeu com o pai e que garante sua parca sobrevivência. O jovem é inteligente, dizem seus companheiros de profissão mais antigos, mas imprudente. Creio que já percebemos isto, não é? 
— Ele tem razão, cara. Já estamos atrasados. 
— Só mais um minuto ou dois, Israel. 
Narciso se aproxima e agarra pescoço de Willian. A pele do jovem pedreiro começa a esfriar, o ar mais gelado, sua cabeça a doer. Seu pensamento? A comida vai mesmo estragar, que tragédia!

Mogi Guaçu, 29 de maio de 2018, Paul Law 

14 de junho de 2018

Capítulo 7 - V de Verônica

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Os dias que se seguiram na penitenciária feminina foram mais calmos. Vou explicar o motivo. Rita me contou que a notícia de minha existência e prisão se espalhou rapidamente, o que trouxe atenção ao local em que estou “hospedada”. 
As presas que me agrediram tiveram que ser transferidas de pavilhão e Gilda estava respondendo a uma sindicância. A carcereira comentou, ainda, que a diretora podia ser afastada a qualquer momento por ter feito vista grossa ao canivete de minhas agressoras. Rita chegou a comentar que suspeitava que a própria diretora tinha pedido às presas que me testassem. 
O estabelecimento prisional foi visitado por entidades reguladoras, as condições dos presos revistas e adequadas. Até mesmo a minha. Eu já tinha uma cela exclusiva, mas ganhei colchão e papel higiênico, além de livros para leitura. Como havia me habituado em liberdade, passei o tempo nas páginas, esquecendo-me da triste realidade. 
Nos banhos de sol, eu estava algemada nos pés e nas mãos. Até mesmo em minha cela, as algemas de tornozelos se faziam presentes.
Gilda aparecia nas grades de minha cela em seus plantões e me contava alguma coisa do que estava acontecendo lá fora.  Aproveitava para dar sua versão sobre minha condição. 
— Você tem sorte. Todo mundo está de olho, até parece que preso voltou a ser gente.
— Preso é gente — vociferei. 
Ela deu de ombros, respondeu: 
— De todo jeito, vamos ver até onde você vai. Lembra-se do que te disse no primeiro dia? Eu quero ver até quando consegue sobreviver.
Ainda bem que eu tinha o livro, pois as presas não se aproximavam de mim. Elas tinham medo, explicou-me Benedita, a outra carcereira. Medo de que eu revidasse ou de que fossem transferidas. 
Eu ansiava por uma visita, qualquer uma, fosse Felipe para me pedir desculpas, fosse Valéria para me tirar de lá ou Meire, para me levar a outra audiência. Entretanto, elas não vieram, mesmo o grande volume de pessoas nos dias de visita dizendo o contrário. 
As pessoas até queriam me ver, mas não podiam. 
Então, num dia que não era reservado a visitas uma equipe de TV apareceu. Sim, foi desse jeito que eu conheci Marcelo Siqueira, o jornalista que me descobriu. Ele era o homem com o microfone na mão que se aproximou do corredor de celas dizendo que mostraria em primeira mão o primeiro super-herói da história. 
Eu o odiei imediatamente. 
Era um homem alto, de pele clara, olhos castanhos e barba bem cuidada. Os cabelos penteados para trás, lisos, fixados por gel. Vestia um terno fino, tinha uma barriga sobressalente. Vinha acompanhado de um cinegrafista. 
— Mostra aqui! — foi a primeira coisa que ele disse, referindo-se a mim. 
Eu encarei a câmera com aborrecimento. Afastei-me das grades. Marcelo me disse:
— Sou Marcelo Siqueira da TV Local, como vai? O público quer saber como você conseguiu seus poderes. 
Eu não lhe respondi. Ele continuou falando de mim, do processo e de sua opinião sobre minhas atitudes. Insistiu mais uma vez por uma declaração, que recusei. Falou:
— Bem, gente, ela não quer falar. É uma pena, já que a população gostaria de saber por que ela não ajuda as pessoas.
— Você não sabe nada sobre mim! — respondi, irritada. 
— Estou escrevendo um livro a seu respeito.  
— Como você me descobriu? 
Ele sorriu com vontade e fez um sinal para que a gravação fosse interrompida. Aproximou-se das grades e me contou, triunfante:
— Explica uma coisa: se estava tentando se esconder, por que fez exame de sangue no Hospital Municipal?
— Então foi assim que fui descoberta... 
Eu sabia do que o repórter estava falando. Foi numa manhã no Hospital Municipal e aconteceu por insistência de Felipe. Ele teimou que eu deveria realizar exame de sangue para saber a tipagem, a fim de evitar o problema do fator RH caso tivéssemos filhos. Eu tentei convencê-lo de que não era preciso realizar qualquer exame; disse que tinha medo de agulhas ou qualquer coisa parecida, mas pouco convincente. Isso o deixou cismado. Com a minha recusa confessou-me que achava que sua namorada estava escondendo algo. Estava mesmo, mas não o que ele imaginava; não uma doença, bem talvez uma doença, mas não o que ele pensava que fosse. No fim, cedi e realizei o exame, cujo resultado, soube dias depois, foi normal e minha tipagem sanguínea deu para AB. 
— Tenho contatos no laboratório do hospital, sabia? Eu farejei uma boa história, assim que minha fonte me falou sobre células com propriedades incríveis. 
— Você arruinou minha vida! Eu não sou uma criminosa! 
— Acha que isso importa? Parou para pensar no que está em jogo aqui? Eu sou só um cara que apresentou fatos contundentes sobre um ser com a capacidade de se regenerar instantaneamente, o que aconteceu depois não tem nada a ver comigo.
— Você começou com tudo isso! A culpa é sua! 
— Escute, estou faturando com o que descobri, nada mais justo. Consegui um emprego na televisão e quer saber? Ninguém liga se é verdade ou não. Eles querem notícia. Você pode ficar calada, pode responder as minhas perguntas, tanto faz. O que importa é o que eu farei depois com as imagens que consegui aqui. É assim que as coisas funcionam, Mulher-Maravilha. 
— Você é sujo! 
— Obrigado — Marcelo Siqueira fez uma reverência. 
Pigarreou e se voltou para o cinegrafista. Disse:
— No três voltamos a gravar. Um dois...