21 de dezembro de 2020

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Conseguiu ler o título da postagem? É isso mesmo, o meu novo livro será lançado oficialmente no dia 4 de janeiro de 2021.  

Veja a sinopse do livro: 

Daqui a cem anos o mundo será gerido por grandes empresas e o teletransporte de pessoas será corriqueiro. Haverá a MIM, um sistema que conectará o cérebro das pessoas diretamente à internet, pelo qual elas obterão conhecimento, habilidades e entretenimento. 

Um suposto erro envolvendo a MIM de Cássio André, um cidadão comum desse futuro, o impede de entrar em casa e ele é desconectado do sistema. Ao tentar resolver o problema, conhece Albert, um representante da FAXINA e descobre que querem matá-lo. Inicia-se aí uma grande aventura que transformará sua vida para sempre.

EXTRAORDINÁRIO NOVO EU é uma história que trata de temas como tecnologia, sentimentos, marcas, privacidade e redescobrimento da própria identidade.

O link no Skoob:

https://www.skoob.com.br/extraordinario-novo-eu-11663849ed11680457.html

Logo trago novas informações, como pré-venda e primeiras páginas do livro. 

Abraço!

4 de dezembro de 2020

Minha resposta



Primeiramente gostaria de agradecer pela descrição da sua pessoa. Não ia escrever que você é bonita para não gerar mal interpretação, mas é o que penso, de todo jeito (e foi o que acabei escrevendo). Bem, posso pedir desculpas e argumentar que a caneta vai passando pelo papel conforme os pensamentos vão acontecendo. Rasurar me parece pior, concorda? Você ia ficar tentando descifrar o que escrevi e risquei… Eu poderia começar de novo, pois escrevi pouco até agora. Mas eu não quero fazer isso. Acho que planejar muito o que fazer tira a graça do fazer. Além do mais, como disse na primeira carta que lhe enviei sou péssimo com começos. Fica assim, ok? 

Registrando que não me escreveu sobre o seu trabalho.

Sua história sobre cobras gigantes metálicas que mais tarde foram chamadas de trem e a previsão de relógios comunicadores é bem curiosa, viu. Ela me faz refletir sobre a minha incrível teoria do tempo; aquela que mencionei na primeira vez que te escrevi. Eu desconfio de que o tempo não existe e que futuro, passado são só o presente de certa perspectiva. Não é muito complicado entender. 

Aqui dificilmente paro só para conversar com alguém. Sempre há um pedido, segundas intenções, compreende? Se me chamam para almoçar, por exemplo, é para pedir apoio em uma eleição sindical ou me cobrarem de algo que fiz ou deixei de fazer na escola. Não estou reclamando, só fazendo uma constatação mesmo. Parece que todo mundo precisa de um motivo para se encontrar com outra pessoa, o que tem certa lógica. Vivemos tempos em que ser útil e produtivo é uma necessidade. Em contrapartida, contrariando tudo isso, passamos dias e noites enfurnados em casa assistindo intermináveis séries na Netflix ou só descendo a tela do Facebook em nossos celulares; postando fotos de falsa felicidade no Instagran. Parece que temos carência de perder tempo; de encontros despretensiosos como os que você me relatou que ocorrem aí. 

Fiquei com inveja, acho…

Vamos mudar de assunto? Esta semana vi um vídeo de uma velha senhora que foi bailarina. Na filmagem ela escuta os acordes de “Lago do Cisne” e começa a movimentar os braços e a cabeça no ritmo da coreografia. Os movimentos são suaves, bonitos, como os de uma jovem dançarina. Mesmo assim, se observarmos antes da dança ou depois, vemos uma senhora bem debilitada pela idade e que não consegue andar (dançar). Sabe o mais incrível? Ela tem Alzheimer e não se lembra de si, da família ou de ir ao banheiro. A música (a arte) a leva de volta ao tempo de bailarina… 

Será que seu ficar velho e perder a capacidade de pensar, poderei recuperá-la ainda que momentaneamente quando ler suas cartas? Saberei lê-las? Lembrarei de você? Eu espero que sim. Se eu estiver certo terei, enfim, desenvolvido o método científico para comprovar a minha teoria sobre a inexistência do tempo.

Desculpe por estar meio filosófico nessa carta, mas não consegui evitar. Tento me apegar a alguma explicação ou esperança para tolerar esses dias difíceis. Sua resposta é o que me anima sempre. Já estou aguardando-a. 

Professor de Geografia.

26 de novembro de 2020

Machado de Assis em Mogi Mirim


Não faz muito tempo passei na Lê&Cia, loja de livros de Mogi Mirim, para ver como o meu amigo João, o proprietário da loja, estava. Nesta oportunidade, vejam vocês, conversamos sobre Machado de Assis, o maior escritor brasileiro de todos os tempos (bem, pelo menos é o que penso). Ele, então, me disse que Machado havia mencionado Mogi Mirim em um de seus escritor. Mais que isso, falou que tinha como provar. Mostrou-me o livreto "Crônicas Escolhidas" publicado pela Folha de São Paulo na década de 90, dado como mimo aos assinantes do jornal em certa ocasião.

Quer saber outra? Eu ganhei o tal livro e pude ver por mim mesmo do que falava o meu amigo! Compartilho, agora, com vocês.

Trata-se de uma crônica intitulada pela Folha como "Caso de Bigamia" e está disposta entre a página 174 a 177 do referido livro, originalmente escrita em 23 de setembro de 1894 para o jornal Gazeta de Notícias do Rio de Janeiro. Nela Machado de Assis escreve sobre um caso real ocorrido naquele tempo sobre um julgamento em que um homem era acusado de ser bígamo. A defesa do capitão Louzada formulou a tese de que o homem não poderia viver em bigamia com a Sra. Maria Carlota, pois sua esposa, a Sra. Maria Henriqueta, não era quem dizia ser. Explicando melhor, quem se passava por Maria Henriqueta era sua irmã que assumira o lugar após a morte da esposa de Louzada. Confuso? Mirabolante? Tudo isso! O que a defesa queria explicar era que não havia bigamia, pois não se tratava da esposa de Louzada, mas sua cunhada! A esposa estava morta e enterrada no lugar da cunhada! Obviamente que  tal artimanha era exagerada e descabida, fato que rendeu a Machado o recheio que precisava para escrever a crônica aqui comentada.       

Abordando o caso de forma irônica o fundador da Academia Brasileira de Letras começa dizendo que se converteria ao espiritismo, única doutrina verdadeira no mundo e capaz de elucidar o caso. Aduz que era preciso convocar o espírito da mulher falecida para que ela por si mesma esclarecesse sua identidade. Era o único jeito. 

É preciso fazer um pequeno comentário sobre o instituto casamento no final do século XIX. Um homem daquele tempo tinha a obrigação de prover sustento de sua família, não deixá-la passar necessidades. Por sua vez, a mulher tinha a obrigação de ser fiel ao homem, cuidar dos filhos e da casa. Posto isto, só se poderia alegar bigamia, a única possibilidade de dissolução do casamento civil, para o caso em que uma das partes não cumprisse sua função no casamento. Louzada estava deixando sua mulher e filhos passarem fome, por isso o caso veio a tona. Há um estudo acadêmico sobre o caso e você pode conferi-lo aqui. 

Mas então, onde está Mogi Mirim nessa história toda? 

No decorrer de sua explanação sobre a importância do espiritismo, Machado de Assis alega que, segundo a Ordem, em Mogi Mirim acabara de enlouquecer um burro do Dr. Santo Di Prospero (meu amigo jura que esta família é conhecida em Mogi Mirim, mas me falta este conhecimento). O animal certamente tinha um espírito de homem ilustre e inteligente dentro dele, daí a razão de perder a lucidez. Não aceitava zurrar ao invés de falar, nem a andar de quatro patas. 

De todo jeito, concordando ou não com a veracidade da doutrina ou da história de Louzada ou, ainda, do burro mogimiriano com espírito ilustre, fica registrada a curiosidade. Eu me encantei em conhecer um pouco mais dessa fantástica saga. Espero que você também tenha gostado. 

Abraço!    

17 de novembro de 2020

Troféu Arte em Movimento 2020

Aconteceu em São Paulo neste último dia 8 de novembro a já tradicional entrega do troféu Arte em Movimento, premiação que enfatiza o artista e empresas voltadas para arte sem apoio da grande mídia. Todo ano, o troféu destaca fomentadores culturais espalhados por todo o país e mundo. Criado pelo artista plástico ZEP em 2014, o Arte em Movimento está em sua 6ª edição e já valorizou muitos bons artistas. Este ano em especial, nossa região foi representada pelo escritor Marcos Cunha e o ator e lutador Cosme Baiano. 

Jamelão e os Anjos da Rua também estiveram presentes.

Veja algumas imagens do evento:







Que em 2021 o Arte em Movimento cresça ainda mais e que tenhamos uma premiação sem preocupações com a Covid-19. 

Fica o registro e os parabéns a todos os que receberam o troféu. 

10 de novembro de 2020

Éden de Paulo Uzai Junior

 


O paraíso dos próximos dias

Éden é uma franca distopia do autor Paulo Uzai Junior. Com sua narrativa coesa, direta, o autor nos apresenta um futuro crível, produto dos nossos hábitos e posicionamentos atuais. Como é de se esperar em análises assim, o cenário não é muito otimista. 

Acompanhamos a história de Sandro Almeida um típico cidadão da São Paulo do futuro; um trabalhador burocrático de uma repartição pública, cansado do modo como as coisas são. O seu companheiro de trabalho, Matias, o irrita; o seu chefe idem. Parece que algo está errado no mundo e, embora ele não saiba o que seja, sente-se mal com isso. O enfado aumenta após ter sua sugestão de treinamento de funcionários rejeitada. Geraldo pede a Sandro que aplique o treinamento nos exatos termos de sempre, desconsiderando o argumento do subalterno de que o rendimento na repartição vinha caindo. No trabalho, na primeira entrevista com os candidatos, Sandro lhes pergunta o porquê da escolha daquela profissão? Ninguém sabia responder; ninguém pensava direito... O curso é interrompido por conta daquela questão inapropriada. Sandro é afastado do comando do treinamento e discute com Matias. Ao ofendê-lo é condenado criminalmente, mas dado o seu estado psicológico (não se alinhar ao modo como se deve agir em sociedade) Sandro cumprirá pena em um sanatório. No ambiente hospitalar é que o protagonista se depara com a verdade. Depois disso ele nunca mais poderia viver como antes.

Em Éden o leitor vai se deparar com várias consequências do modo como interpretamos o mundo hoje. Questões como aborto, suicídio, consumo, drogas são exploradas de modo reflexivo. Sem falar em pedofilia e banalização dos relacionamentos. Como já foi dito não é um cenário positivo e serve de alerta para mudanças. O autor tem boa bagagem filosófica para conceber essa reflexão, citando outros autores e obras num contexto um pouco exagerado, mas necessário ao pensamento. O livro choca, emociona e nos convence. Claro que é uma opinião, um modo de ver as consequências do que julgamos "certo" hoje. Toda reflexão é bem-vinda e edificante.

Não estão fora de Éden a evolução da comunicação, do transporte, da alimentação. O mundo é um lugar de aparente paz, de felicidade e de religiosidade (espiritualidade baseada na valoração do eu). Matias faz o perfeito contraponto ao modo de pensar de Sandro, sendo através dele que conhecemos as engrenagens dessa sociedade evoluída. O personagem é falso, engajado, oportunista e raso em argumentos, mas, mesmo assim, é bem visto no seu círculo social. Sua acensão é notória. 

Apesar de buscar a verdade e estar do lado "dos mocinhos" as consequências para o protagonista não são as mais vantajosas, quebrando aquela matemática de sempre. O desfecho é surpreendente e apesar de franco e consequentemente negativo, tem sutilezas de esperanças. Já conheço o modo de narrar de Paulo Uzai Junior e ele muito me agrada, mas me surpreendo sempre com sua evolução literária e filosófica.     

Eu suma Éden é um livro que apresenta uma visão de futuro atual que não merece julgamento mas reflexão. Talvez, também, uma edição que faça justiça ao texto e a mensagem. No Clube dos Autores você poderá comprar o livro e ver por si mesmo tudo do que estou falando. Eis o link:


Foi uma leitura boa. Venham outras!
Paul Law  
   

            

30 de outubro de 2020

Por que escrevemos sobre o futuro?


Fonte da imagem 


George Orwell pensou em dias que viriam em 1984; Machado de Assis também ao escrever "Bondes Elétricos", crônica de 16/10/1892. De certa perspectiva Frank Herbert também em Duna, sendo este autor já nos anos sessenta preocupado com o impacto das ações humanas sobre o clima. No cinema vimos Matrix, Robocop, Blade Runner. e tantos outros tecendo cenários vindouros não muito animadores.  Por que pensamos o futuro com pouca esperança? Por que escrevemos sobre ele? 

Recentemente comecei a ler Éden do escritor Paulo Uzai Junior. Em breve o autor Fagner JB vai lançar sua obra "Saudoso Futuro" e eu mesmo lançarei Extraordinário Novo Eu ainda em 2020. Nós três também estamos pensando nos dias que virão. O motivo? 

Conversando com o escritor de Saudoso Futuro colhi dele que não seria normal se as pessoas não pensassem no futuro. Principalmente se levarmos em consideração que o presente não parece animador. Para ele, segundo o meu entendimento, escrever sobre dias futuros é deduzir consequências de atos e posturas atuais. É interpretar resultados e estimular esperanças de que alguma coisa mude.

Paulo Uzai Junior tem uma postura distópica, crítica sobre aspectos contemporâneos, o que, ao meu entender, não é alheio ao ponto de vista anterior. Ao que parece, ambos os autores possuem a intenção de compreender o presente, estudando passado e projetando o futuro. Creio que os escritores citados no início do texto também tinham isto em mente.  

Queremos entender o mundo em que vivemos. 

Em Extraordinário Novo Eu, também tento compreender aspectos contemporâneos e seus desdobramentos. Numa abordagem talvez exagerada teço um cenário não tão pessimista (pelo menos do ponto de vista apocalíptico), mas ainda assim perturbador, focado em crises de identidade; o ser e o ter; marcas que possuem em si um valor social; posições e seleções. Embora pregue-se a não discriminação e será assim no meu futuro, imagino grupos bem definidos. Rótulos. Não posso dizer que o meu futuro e menos ou mais pessimista do que o de Éden ou o de Saudoso Futuro, mas não foge a regra de querer entender o mundo (e desejar estar errado?).

No fim acredito que temos receio dos dias que chegarão já prevendo sofrimentos e desigualdades. Historiadores muito mais gabaritados já disseram que para entender o presente é necessário conhecer o passado. Para o futuro? Aplicamos a mesma regra só mudando as palavras fatos históricos por ficção científica.

Para não terminar fatalista, a surpresa ainda é o maior dos substantivos e é ela que pode enterrar todas as previsões. Para o passado ela não funciona, mas para o futuro...

Não digam que não falei de esperanças.      

16 de outubro de 2020

Duna - Frank Herbert


Interplanetário, mas bem terreno 

Em 1965 Frank Herbert publicou Duna, o primeiro livro de uma série de ficção científica interplanetária que viria a se tornar referência no assunto, servindo de inspiração para várias produções cinematográficas, como Star Wars e Star Trek. Na verdade, Duna é um marco da cultura pop, cujos pilares ainda sustem várias produções. O que o livro tem de especial? Talvez sua abordagem política e a visão tecnológica de mundos evoluídos e extraterrestres.

Este primeiro livro conta a história de Paul Atreides, filho do Duque Leto com sua concubina Jéssica. A família que até então governava um planeta cheio de vida chamado Caladan é obrigada a mudar de planeta pelo imperador. Eles vão para Arrakis, o planeta deserto antes governado pelo Barão Harkonnen. No local também conhecido como Duna, Paul descobre que existe um plano entre o imperador e outras casas reais, especialmente a Harkkonen, para exterminar sua família. Então, com apenas 15 anos e com o treinamento especial bene gesserit aplicado por sua mãe, o rapaz terá de enfrentar um mundo hostil e pessoas que querem matá-lo. 

Duna é um livro que começa difícil de entender, pois faz uso de muitos termos criados pelo autor sem nenhum parâmetro com o que conhecemos. Expressões como bene gesserit, suspensores, trajes destiladores, gom jabbar aparecem na história sem explicações. No entanto, conforme a aventura avança e os termos se tornam recorrentes, o leitor vai descobrindo por si só do que se tratam. Seita especial de mulheres super treinadas, dispositivo que ajuda pessoas a se locomoverem com agilidade, roupa coletora de água corporal e teste de dor. No final do livro tem as explicações, mas não são necessárias, já que vamos aprendendo enquanto lemos. 

O personagem central de Duna, Paul Atreides é bem construído. Sua evolução é gradativa, normal. Nada de ser um sujeito especial desde o início. Ele é impulsivo, imaturo, tem medo. Contudo, o treinamento de sua mãe aliado às dificuldades enfrentadas no deserto o ajudam a entender sua condição e o que precisa fazer. Paul, mais tarde adquire uma áurea messiânica, mas isso não é motivo para enfrentar menos dificuldades. 

A povo Fremen, nativo de Duna é tribal, guerreiro, possui sua própria religião e cultura. Aliado a ele o protagonista ganha força e condição de negociar com outras casas (famílias que governam planetas), com a Corporação (a empresa que fornece energia aos planetas) e com o próprio imperador. É nesse ponto que a obra se torna política e bem terrena, explorando alianças, vantagens e chantagens com o intuito de manter, destituir ou aumentar o poder dos governantes. O final da história se dá como resultado de boa articulação política, atrelada a condições favoráveis conseguidas com empenho militar. 

Em suma Duna é sem sombra de dúvidas uma obra ficcional incrível com alegorias inteligentes e precisas sobre governo, mercado e exploração de recursos naturais. Escrito lá em 1965, revolucionária e profético sobre a escassez da água. Herbert teve uma visão de mundo a frente de seu tempo, interpretando consequências que não são evidentes nem mesmo atualmente. Com espaço para ser visualmente interessante, fato explorado em outras produções, Duna não se resume a isso. É uma obra que fala muito da Terra e de seu futuro. 

Extremamente empolgante, fica a resenha e a dica de leitura.  

Abraço.                       

6 de outubro de 2020

Como é o vestido


Professor, antes que fique pensando besteira a meu respeito, vou me descrever nesta carta, está bem? Ah, fico contente que tenha gostado da música que indiquei. Será que João Paulo e Daniel vão fazer sucesso por muito tempo? Eu os acho muito talentosos e torço para que sim. Não pense que eu não entendi o que você quis que eu entendesse, ok? Só que não vou comentar nada. Por enquanto pelo menos.

Quer saber o meu lugar no mundo? Eu prefiro pensar de outra forma.  Agora, por exemplo, estou em um quarto qualquer, numa noite quente comum, escrevendo para um quase completo desconhecido. O meu endereço é um lugar em que não se chega correspondência. Então, é o que você já sabe: Caixa Postal 28. Amanhã, talvez seja outra Caixa Postal, outro agora, outro lugar.

Gostei de saber alguns detalhes de sua vida. Não vou te julgar por nada, fique tranquilo. Até gostei de saber que gosta de ler, sabia? Pessoas que leem são ótimas contadoras de histórias, penso. Eu não gosto de ler, confesso, mas adoro ouvir uma boa história. Tem vezes que nos reunimos na área de casa e ouvimos histórias. Tem noteis aqui que junta meu pai com algum amigo ou vizinho; algum de meus irmãos mais velhos, minha mãe, tia Dalva e tio Honório ou os primos Mauro, César e Davi para ficar falando de várias coisas. Em dado momento (os meus momentos prediletos) alguém puxa uma história. Meu pai conta histórias que ouviu do pai dele que, por sua vez, ouviu do dele. Acho que histórias não ficam velhas, o que acha? Depois, vamos todos dormir. Vou te dizer que tem vezes que acabo sonhando com o que ouvi. Teve uma vez que o pai falou que o avô dele falou que no futuro ia existir uma cobra gigante de metal que serpentearia as montanhas e faria muito barulho. Ele explicou que o vô falava do trem sem nunca ter visto um! Não é incrível? Acha mesmo que também podemos acertar alguma previsão? Se eu fosse apostar em uma, seria num aparelho de comunicação que mostrasse a imagem das pessoas ao se comunicarem. Já viu “Os Jetsons”? Daquele jeito!

Desculpe, prometi que ia me descrever nessa carta e estou enrolando. Ok, lá vai: sou magra, alta, tenho o cabelo preto e rebelde. Não é nem cacheado nem liso. É comprido pra dar peso e ficar menos armado e quase sempre está preso. Tenho olhos castanhos e enxergo muito bem. Meu nariz é fino, assim como a boca. O meu queixo também e o pescoço é mais longo do que eu gostaria. Acho que sou esticada por completo, não sei. No processo de esticamento, fiquei sem peito e bunda e isso me incomoda bastante. Não acho que sou o tipo de mulher que seria cortejada por causa de sua beleza. Na verdade, sou bem comum e quase sempre não sou notada. Falo pouco, como pouco, não falo muito. Se posso me gabar de alguma coisa é dos meus sentidos: sou boa com as mãos, sei ouvir e observar. O meu preferido é o olfato! Sinto o cheiro das coisas com muito entusiasmo; até mesmo do papel que tenho em mãos agora. O cheiro da tinta azul da minha caneta…

Professor, agora pode imaginar como o meu vestido vermelho ficou ótimo em mim. Não importa o que digam, eu gostei dele. De todo modo, vou ficando por aqui, aguardando sua resposta.

Paz Som do Silêncio


Cartas anteriores

Primeira

Segunda

Terceira

Quarta

Quinta

29 de setembro de 2020

Finda, Maria e o passarinho



Finda abaixou-se para observar melhor um pequeno pássaro de barriga para cima, o peito amarelado, a penugem em volta preta. As perninhas inertes, os olhos fechados, o bico entreaberto. O sol começava a ganhar intensidade, outros passarinhos cantavam, o vento balançava as folhas das árvores. O que havia de errado com aquele passarinho perto dos seus pés? Resolveu tocar-lhe para observar a reação. O resultado? O pequeno ser abriu os olhinhos e piscou algumas vezes. A respiração ganhou intensidade. Por que não se vira? Por que não se mexe? Pensou a criança, tentando entender aquele momento. 

O passarinho fechou os olhos novamente, mas a respiração continuava intensa. Finda o pegou com as mãos sem que houvesse reação. Mexeu na cabecinha do passarinho, mas ele não abriu os olhos. É como uma canseira demasiada, um susto que não passa, uma quietude agonizante. Um sofrer sozinho, mesmo que tenha alguém lhe observando. O que vem depois? O que vai acontecer quando ele parar de vez? A garotinha refletia sobre isso quando o pássaro mexeu levemente uma das asas em suas mãos. Ela prestou mais atenção, talvez ele pudesse reagir… 

O pequeno ser alado mexeu a outra asa, os pés. Abriu os olhos e pareceu fitar quem o tinha nas mãos. Finda retribuiu o olhar com um sorriso, satisfeita. Com delicadeza colocou-o em pé sobre as mãos e fez-lhe um carinho na cabeça. O bichinho pareceu se agradar ao fechar os olhinhos. 

— Agora que parece melhor, eu vou te deixar no chão. Vou procurar água para que beba e ganhe forças para voar.

A menininha afastou-se saltitante. Seu vestido de renda branco sem detalhes chacoalhava pelo caminho até a fonte no pátio do castelo. Os pés descalços encostaram na beirada circular enquanto ela esquadrinhava o local em busca de um recipiente. Do outro lado da fonte ela identificou sua irmã. 

— O que está procurando? — perguntou-lhe Maria.

— Um recipiente para água.

— Para quê?

— Um pássaro que está doente.

— Vi outros assim. Água não vai curá-lo…

— Não acredito em você.

— Pois bem, tome, leve esta vasilha de cerâmica que eu estava usando para brincar. Depois não diga que eu não avisei…

— Obrigada.

Finda debruçou-se sobre a fonte para encher a pequena vasilha cedida por sua irmã, mas se desequilibrou e caiu. Debateu-se sobre a água sem saber nadar, afundando, pedindo socorro. Um soldado ouviu os gritos, outros foram chamados por Maria, sendo que ao final o socorro veio a tempo. Os homens do rei Mario, no entanto, não permitiram que Finda continuasse a brincar por ali mesmo sob intenso protesto da garotinha. Ela tinha que voltar ao pássaro, levar-lhe água. Os homens fardados diziam que ela deveria descansar e se afastar do perigo; que estava molhada e necessitava de um banho e que os soberanos não os perdoariam se soubessem do incidente de afogamento.  

— Não se preocupe, eu faço em seu lugar — disse Maria à irmã.

Demorou um tempo para Maria identificar o local em que o passarinho estaria, de acordo com Finda. Ao identificar a localidade, portando a água na pequena cumbuca, Maria soube que chegara tarde demais. O serzinho alado estava encolhidinho, imóvel. Faltava-lhe algo importante. Para se certificar, mexeu com ele, mas nada aconteceu. O bichinho estava rígido como alguns outros pássaros que ela já tinha visto por aí. 

Maria, então, esvaziou sua vasilha. Pegou o passarinho com as mãos e se afastou dali, pensando que a irmã ficaria muito triste em vê-lo daquela maneira. Sua ideia foi a de cavar um pequeno buraco e enterrar o bichinho. 

Mais tarde, já podendo deixar os cuidados dos soldados Finda correu para ver o passarinho ou ter notícias do caso com a irmã. Ao chegar no local, no entanto, não encontrou o bichinho. Viu apenas a vasilha vazia. 

— Ele não está mais aí — era Maria chegando com o vestido sujo de terra na altura das coxas.

— Não me diga que…

— Ele voou, foi embora. Joguei a água fora e fui brincar na terra.

15 de setembro de 2020

Acordei com você na cabeça


Paz, como deve notar pelo título, encontrei a música que me sugeriu. Ouvi por diversas vezes e acho que até a decorei. Se gostei? Eu diria que sim, mas o meu gosto foi influenciado por sua sugestão, então não sei se vale. “Tudo no mundo me lembra você”, já pensou nessa frase da música? Eu fiquei pensando e deduzi que faz muito sentido. Entenda aí o que eu quis dizer…

Ah, sobre Geografia, realmente se trata dos temas que você mencionou. Só que tem muitos outros também. Clima, vegetação, por exemplo. O que mais me agrada na matéria que leciono é mesmo o fator espacial. O lugar das coisas, sabe? Em Geografia tem muito disso. Saberia me dizer o seu lugar no mundo? Usaria longitude e latitude para isso? Tem outros meios também: que tal me passar o seu endereço, em vez de uma Caixa Postal?

Resumindo, a Geografia serve para acharmos lugares e pessoas.

Sobre mapas eu não passo este tipo de tarefa aos meus alunos. Isto está ultrapassado, mas não vou entrar em detalhes. Acho que aprendi minha lição com o Youtube, não é?

Ei, minhas perguntas não são esquisitas! Apagar o sol quando ninguém está vendo é muito normal, não é?

De todo modo, vou falar um pouco de mim. Sou professor, moro sozinho e trabalho muito. Sei cozinhar o básico, mas poucas vezes me atrevo a pilotar o fogão (o convite para comer suas batatas está aceito, viu). Nas horas vagas leio e escrevo. O meu gosto pela leitura é bem variado, Filosofia, Romance, Biografia e Poesia.

Apenas saio de casa para trabalhar. Tenho alguns amigos que visito de vez em quando. Minha família mora na cidade em que resido e os vejo às vezes. Tenho pai, mãe e uma irmã. Ah, raramente fico doente! Nem gripe, acredita? Não sou gordo nem magro, detesto exercícios físicos e bebo socialmente. A minha barba é rala e meu cabelo grosso. Tenho improvisar penterados, mas ficam horríveis, então corto bem curtinho. Pra falar a verdade, não sei se alguém repara em mim.

Aliás, que tipo de trabalho você faz aí?

Fiquei te imaginando vestida com a roupa nova que comprou. Não é um pensamento erótico, nem nada disso. É só imaginação mesmo… Eu te vejo com o lindo vestido vermelho caminhando em uma estrada qualquer. Minha visão é de longe, mas sei que é você. O tempo está fresco, venta. Acho que vai chover, o que me diz? 

Vou ficando por aqui, aguardando ansiosamente sua resposta.

14 de agosto de 2020

Ao professor

 

Já que é para dar nomes, tomei a liberdade de te dar um. Professor, que tal? Não é lá muito criativo, mas foi o primeiro nome que me veio à mente depois de ler a carta que me mandou. Fiquei pensando em sua profissão e como ela é importante. Tive os meus professores também, mas penso que são diferentes dos seus ou de quem você é. Falo isso pelo conjunto de tudo que li em sua carta, já que mencionou lugares que me são estranhos. Pelo menos de batata frita entendo bem. Eu mesma sei fritar, sei fazer ficar sequinhas, uma delícia. Poderia te convidar para provar, mas seria apenas por educação, então… 

Tente imaginar aí como são minhas batatas fritas. 

Só para registar: que ideia estranha me chamar de Paz. Tem noção? Pior ainda é sua atitude de não concordar comigo sobre o som do silêncio ser paz. Para alguém que quer me fazer mudar de ideia, você está se saindo muito mal. Anote aí que eu não gosto de ser contrariada. Então, sinto muito, não vou dizer o que penso quando estou batendo palmas em uma festa de aniversário. Está bem, estou pensando nisso agora, mas não vou escrever. 

Acredito que estava ensolarado quando me escrevia, não se preocupe. O seu sol até pode ser o mesmo que vejo neste momento. A diferença é que ele está indo embora agora. Como logo desaparecerá aqui, talvez surja aí, não é mesmo? Se as coisas não são observadas por alguém, poderiam deixar de existir. Seria uma maneira legal de economizar energia, o que me diz? O meu pai sempre reclama de luzes acesas sem ninguém no cômodo. Diz assim:

— Por que lâmpada acesa sem ninguém dentro do quarto?

Ele tem razão, mas muitas vezes eu esqueço de apagar a luz. Talvez Deus também reclame das coisas não serem desligadas depois que paramos de olhar. Ele diria assim:

— Por que o sol aceso sem ninguém para ver?

Será que alguém se esquece de apagar o sol? 

De todo jeito o sol já se foi, se apagou, alguém o apagou, sei lá. O céu está escurecendo e as estrelas mais brilhantes já aparecem perto do horizonte. Eu tenho a impressão que as estrelas que brilham mais são próximas do horizonte. Gosto de observá-las perto da luz do dia indo embora. Eu tenho quase certeza de que há muito tempo você não vê um pôr do sol. 

Vem cá, só sabe fazer perguntas esquisitas? 

Fiquei curiosa sobre sua profissão. Pra ser precisa sobre Geografia. Eu me lembro que Geografia era a matéria em que estudávamos os planetas, o clima, as regiões do país. Ah, era nas aulas de Geografia que fazíamos mapas! Usávamos papel de seda para copiar o mapa do Atlas e depois passar no caderno com uma caneta de ponta fina, preta. E essa caneta era bem cara, viu! Você passa mapas aos seus alunos? Se fosse meu professor ficaria orgulhoso do meu capricho. 

Se bem que faz alguns anos que terminei os estudos. Fiz até a oitava série, depois tive que sair da escola. É que os livros do 2º Grau eram muito caros. Além disso, eu já tinha idade para trabalhar por aqui. Hoje já me acostumei e até me sobra um pouco de dinheiro que uso para comprar discos e roupas. Comprei um vestido de linho, vermelho que é a coisa mais linda! 

Bem, é isso. Vou ficando por aqui, ouvindo João Paulo e Daniel. Procure aí pela fita que tem a música “Só dá você na minha vida”. 


Lei as outras cartas:

Primeira

Segunda

Terceira

6 de agosto de 2020

Para começar a ser pai você precisa estar lá

Imagem retirada do blog Consultório Sentimental


Pai é pai. Por mais óbvio que a afirmação possa parecer, para mim, carrega muito significado. Ser pai é ser e por isso não é muito fácil. A primeira coisa que alguém que "é" precisa fazer é "estar lá". Estando lá você pode tentar ser o que precisam que seja. Do mesmo jeito que o filho vai aprendendo a ser filho, o pai vai fazendo a sua parte sobre paternidade; vai observando um serzinho quieto, muito parecido com um boneco de brinquedo, ganhar movimentos, sons, expressões e espaço no Mundo. Enquanto essas coisas acontecem, as ações do pai que basicamente são comprar comida, fraudas, levar ao posto de saúde para tomar vacina, comprar e trocar roupas, vão evoluindo. Ser é estar lá! 

O meu pai, por exemplo, não fez curso de como ser pai; não perguntou ao pai dele como deveria agir agora que era pai também; não leu livros que ensinavam paternidade; nem pesquisou no Google como ser um bom pai (não havia Google naquele tempo). Mesmo assim, contra todos os prognósticos, com todos seus defeitos, suas qualidades, meu pai é pai. Sabem por quê? Ele estava lá! Ele ainda está... 

Eu me lembro de muitas ocasiões em que ele esteve presente e que eu até nem queria que estivesse, mas fico feliz hoje por ele ter estado lá. Acho que eu já escrevi isso uma vez, mas vale repetir: a qualidade que mais admiro no meu pai é sua capacidade de não desistir. Ele é bem teimoso e teve vezes que eu quis desistir do que fazíamos, mas ele não! No fim, acabamos fazendo o que eu teria desistido de fazer.  

Conheci ótimos pais e geralmente foi por causa de seus filhos. Funciona assim: a criança, o adulto, o adolescente é educado, tem caráter, se comporta bem: o pai é bom. A família toda é boa! É claro que isso não é uma regra, nem mesmo o inverso deve ser considerado verdadeiro.   

Sei de muitos outros pais: aquela mãe que criou seus filhos sem ajuda de um companheiro, trabalhando muito! Quando ela chegava do trabalho exausta e reencontrava suas crianças, além de mãe ela era pai. Aquele irmão que ficou no lugar do pai que foi embora ou faleceu; aquela irmã, aquele amigo, aquele vizinho, aquele padrasto, aquele companheiro. Todos eles são pais porque estavam lá. 

Do mesmo jeito, infelizmente, quem não está lá tem muito trabalho para ser pai. É aquela frase que usei para começar este texto: pai é pai. É bem complicado para alguém reconhecer a figura paterna que é distante, que promete ver o filho e não vai, arruma desculpas, deixa a criança com os seus pais nos dias de visita. Mesmo aqueles que moram com os filhos, mas estão distantes, pensando em sucesso profissional ou aplicações financeiras.    

Também já escrevi em algum lugar que uma das coisas que mais me enche de orgulho é ouvir minhas meninas me chamarem de pai. No cotidiano mesmo, ao pedirem alguma coisa, se queixarem do que uma fez a outra ou no fim de noite quando escuto quase sempre "Eu te amo, pai".   

Então, penso que ser pai é uma coisa muito próxima de estar presente.   
 

28 de julho de 2020

Dom Quixote - Volume II



A aventura épica continua (e termina)

A segunda parte das aventuras do valoroso Dom Quixote foi publicada originalmente em 1614 com o nome de "O engenhoso cavaleiro dom Quixote de La Mancha". Os leitores do primeiro volume tiveram que esperar dez anos para conhecerem a continuação da história do fidalgo mais famoso do mundo. Neste ínterim, foi lançada uma continuação falsa de autoria de  Alonso Fernández de Avellaneda.

O segundo volume de Dom Quixote começa com a terceira saída do fidalgo de sua vila para viver aventuras de cavaleiro andante, cujas façanhas havia aprendido em livros de cavalaria. Aliás, como é do conhecimento dos leitores do primeiro volume, foram as leituras que deixaram Dom Quixote louco e o fizeram desejar reproduzir as façanhas dos livros na vida real. Desta vez, no entanto, acompanhado novamente de seu escudeiro Sancho Pança, o cavaleiro deseja trilhar até Saragoça para provar seu valor como cavaleiro andante. Já de início a dupla precisa conseguir a benção de Dulcineia del Toboso, a musa amada de Dom Quixote. Como é de se esperar a coisa não anda bem e o cavaleiro acaba deduzindo que sua formosa princesa foi enfeitiçada por magos e foi transformada em uma camponesa horrorosa. Os magos, é preciso dizer, vão perseguir Dom Quixote por toda a aventura e serão responsáveis por várias passagens engraçadas. 

Um fato curioso desta segunda parte é que nela fala-se da primeira parte. Personagens que são encostrados pelo nobre cavaleiros já conhecem sua história e sabem de sua loucura. Usam dela para pregar peças em Dom Quixote e Sancho Pança, o que é triste, embora pareça cômico. É um retrato da maldade humana que existia antes do tempo de Cervantes e continua existindo. Indo mais longe, o autor faz Dom Quixote conhecer a falsa segunda parte de sua história que foi lançada antes da verdadeira pelo misterioso Alonso. Promove o encontro do verdeiro Dom Quixote com vários leitores dessa versão não canônica, chegando ao ponto de narrar o pedido do cavaleiro de que um leitor oficializasse publicamente que agora conhecia o verdadeiro Dom Quixote. Nesta obra não há contos paralelos como na primeira, sendo a história mais linear e focada na aventura do Cavaleiro dos Leões e seu escudeiro.

Finalizando, o segundo volume de Dom Quixote é mais longo que o primeiro, mais centrado no personagem principal e tem um bom deslinde As circunstância em que se dá o fim, são criativas e reflexivas. Talvez não fosse ideia terminar daquela forma, já que Dom Quixote ainda renderia boas histórias, mas o medo de ver seu personagem nas mãos de outros tenha influenciado Cervantes a conceber tal fim. 

Fica a resenha e a dica.
Abraço.        

15 de julho de 2020

Para Paz


Errei muito para um começo, não acha? Falei de coisas que você nem faz ideia. Youtube, marca de chocolate, foi boa, admito. Peço desculpas por escrever como se o meu destinatário fosse parecido comigo, foi um erro grave. Um equívoco que costumo cometer sempre, mas vou tentar me policiar, está bem? 

Só que nem de longe você acertou o que é Youtube.

Falando de sua pergunta sobre cheiro (que tipo de pergunta, heim?). Nunca parei para pensar nisso. Acho que por aqui o aroma das coisas não é marcante.   É claro que sinto o cheiro da comida sendo feita, ora essa. Só que faz muito tempo que não cozinho. Tenho feito refeições rápidas para ter mais tempo de trabalho. No shopping, na praça de alimentação, por exemplo, o local em que faço minhas alimentações, tem uma variedade de cheiros e sons que talvez te agrade. O cheiro de batata frita é muito bom. O gosto também. Seria um bom lugar para o nosso encontro, o que acha? Ah, esqueci que me disse que não quer se encontrar comigo. Para ser franco, eu te entendo.

Trabalho em uma escola, sabia? Claro que não, onde eu estou com a cabeça. Sabe agora. Sou professor e meu trabalho é mais como auxiliar no funcionamento da cabeça das pessoas. Plantar sementes de conhecimento, compreende? Faz quase vinte anos que faço isso. De segunda à sexta; das sete às dezoito horas, praticamente. Estou usando o meu tempo de descanso entre dois períodos para te escrever. Eu ensino Geografia, não é curioso? 

Mudando de assunto, pensei muito sobre o som do silêncio. Qual seria? Você me disse que é o de paz, mas eu não sei se concordo. É que posso imaginar paz barulhenta. Sabe quando você está em um show de rock? Curtindo? Acho que estar focado em algo que acontece se assemelha a paz. Já pensou o que sente quando está batendo palmas em uma festa de aniversário? Eu gostaria que me dissesse. 

No mais o que achou do nome que te dei? Paz parece ser um nome bem legal, não é? Fica sendo o seu para eu colocar no envelope das cartas, pois não se aceita nos Correios uma carta sem o nome de um destinatário. Para a primeira, inventei um nome na hora, acho que foi Maria, não é? Agora vou usar este: Paz. Paz, o som do silêncio. Seu som de silêncio pelo menos.     
              
Então, Senhorita Paz, você recebeu minha carta e respondeu! Sabe que fiquei muito feliz com sua resposta, mesmo que desdenhando da minha grande teoria sobre o tempo. Eu ainda vou te provar que estou certo. Mais que isso: vou te convencer a se encontrar comigo. Não que eu seja um homem extraordinário, longe disso. Sou bem comum, na verdade. Só que comum é bom, não é? Eu acho que sim. Um pouco solitário… 

Ah, sobre a chuva! Não está chovendo agora. Choveu noite passada, mas não vale, certo? É pouco mais de meio dia e faz um sol de rachar. Será que este sol é o mesmo que você pode ver agora que está lendo esta carta? Queria que me dissesse também. Como fui sincero com você, espero que seja assim comigo também.

9 de julho de 2020

De outra pessoa para alguém


Você tem problema, sabe disso não é? Eu não deveria te responder, mas como previu, fiquei brava com o que li. Que história é essa de comparar o tempo com uma linha cinza que vai ficando vermelha. Sei bem o que é fita cassete e até mesmo CD, mas Youtube? Isso é nome de chocolate? Pior ainda foi a ideia de que o tempo não existe. O que andou fazendo na escola este tempo todo? Aliás, o que está fazendo da sua vida! 

Caso queira saber e acho que quer, aqui tudo está bem. Diferente do que você acha, os dias estão passando normalmente. O sol nasce sempre no mesmo lugar, banha os grandes eucaliptos sempre do mesmo modo e ao final, se põe na outra extremidade, deixando o cheiro de mato esfriando no ar. Ouço os pássaros, vejo o cinza ir apagando as cores do dia e as estrelas ponteando o céu. São muitas estrelas daqui! Têm vezes que a lua cheia preenche o céu e quase parece dia. Um dia de noite e sem cor, sabe? Tem época em que ouço o coaxar dos sapos que é bem triste. Galinhas sobem nos galhos da jabuticabeira e se ajeitam para dormir logo que começa a escurecer. O vento, o bates das asas, tudo tem um som. Até o silêncio tem som, não é? O som de paz.   

Penso que ver, cheirar, ouvir e degustar te faça falta. Não existe cheiro por aí? De comida sendo feita pelo menos. Sua vida é ficar vendo linha vermelha passar num retângulo num treco chamado Youtube? Desculpe, mas eu não consigo imaginar algo assim sem pensar em sorvete, chocolate, essas marcas de coisa de gente rica. Você me faz rir com essa maluquice. Mas ainda estou brava, fique sabendo.  

Falando sobre o nosso encontro, penso ser extremamente difícil. Nós nem nos conhecemos pessoalmente. Na verdade, não sabemos nada um do outro, sendo que tudo o que sei de você é o que li em sua carta (o que não ajuda muito). Não é só por isso, nem porque o tempo não existe, mas sim porque não quero. Não me leve a mal por ser honesta a este ponto, mas é melhor pecar por sinceridade do que por falta dela. 

É uma questão matemática, pense bem. O que um não quer, dois não faz.  Não é pessoal, ou é, sei lá. 

Chove agora aqui. Neste exato momento ouço o barulho da chuva sobre o telhado e é bem gostoso. Tem uma goteira perto da mesa, mas tomo cuidado com o papel que uso para te escrever. Será que vai chover quando minha carta chegar até você? Eu gostaria que me contasse se sim. Não vale mentir, ok? Eu vou saber se for mentira, eu sempre sei.

1 de julho de 2020

De alguém para outra pessoa


Oi, tudo bem? Eu espero que sim. Não sei como começar a te escrever, então pensei em falar da minha teoria maluca do tempo. O tempo não existe. Não é para rir, é sério e vou te provar! Eu estou aqui, digamos num tempo e espaço diferente de você, correto? O que faço agora será lido por você depois. O meu presente será o seu futuro e o seu presente será o meu passado. Parece complicado, dizendo assim, mas não é. É bem óbvio até… Qualquer um percebe isso. De todo modo, dá pra perceber só por isso que não é claro definir tempo. Tempo é coisa de cada um? Você tem o seu e eu o meu? Eu posso aceitar isso. Posso ir além, se quer saber. Eu penso que o meu tempo é tudo o que existe é até meio louco pensar como penso, mas não consigo evitar. Sou Gabriela, eu nasci assim, vou morrer assim. 

Aposto que você não sabe onde estou agora! Nem eu, pra ser sincero. É porque o meu agora é diferente do seu. Por outro lado, é estranho imaginar o local em que você está. Seja agora ou depois (estou me usando com referência). Se eu estiver certo, e o tempo não existir, vou conseguir te encontrar. Certo, não será um encontro daqueles. Não como a maioria das pessoas imaginam (as normais pelo menos). 

Eu disse que não sabia como começar, não disse? 

Acho que Chico Buarque falou uma vez que o começo é só o começo e que nem sempre continua sendo começo depois que a história se desenvolve. Nas edições, pode-se criar um texto inicial, ou mudar a ordem de capítulos. Ele entende que é preciso começar de algum modo. Talvez seja isso que eu estou fazendo agora, percebe? Talvez quando você ler esta carta, este texto não seja a primeira coisa a ser lida. Bem que eu gostaria de ter um começo melhor, mas por enquanto este vai servindo. 

Vou escrever um pouco mais sobre a minha teoria revolucionária sobre o tempo. A inexistência dele, como já disse. Pra começar (vamos lá!) imagine uma fita cassete. Exemplo ruim? Ok, então vamos imaginar um CD. Esqueça o CD, acho que ele é velho demais, também. Um vídeo no Youtube, certo? Temos a tela preta onde se desenrolará o vídeo. Há uma linha branca na parte inferior do retângulo que vai sendo preenchida por uma linha vermelha enquanto o vídeo vai passando. Quando a linha vermelha chega na extremidade do retângulo, o vídeo termina. Eu penso no tempo como aquela bolinha vermelha que vai correndo pela filmagem e preenchendo a linha branca de vermelho. Ela corre de um ponto a outro e só! Não pode extrapolar os pontos pré-definidos e as coisas acontecem dentro dessa limitação. Não é incrível? Então, não faz sentido a minha teoria? O tempo é uma ilusão, como um vídeo na internet. 

Acho que você vai ficar brava comigo depois de ler o parágrafo anterior.

Se ficar, tudo bem.

27 de maio de 2020

Dom Quixote de la Mancha Vol. I



Uma épica e cômica aventura

O livro "Dom Quixote de la Mancha" de Miguel de Cervantes é dividido em duas partes, sendo a primeira lançada em 1605. É considerado como a obra-prima da ficção e mesmo muitos anos do lançamento, continua encantando leitores. Inclusive a mim que tive a honra de conhecê-lo apenas agora. É um livro grande mesmo em seu primeiro volume, por isso optei por dividir a resenha em duas, como foi a publicação da obra na época. 

Nesta primeira parte de Dom Quixote conhecemos o cavaleiro andante que dá nome à obra, um fidalgo de meia idade viciado em leituras de cavalaria. O vício foi tanto que perturbou o discernimento do homem, fazendo-o sair pelo mundo praticando aqueles atos narrados em livros antigos. O seu nome, Dom Quixote também é crianção sua. Na primeira investida o nobre cavaleiro não se dá bem e retorna moído para casa, trazido por conhecidos. Na segunda, a que preenche todo primeiro volume, as aventuras de fato ocorrem. Junto de seu fiel pangaré Rocinante e de seu famoso escudeiro Sancho Pança, Dom Quixote realiza tantas façanhas quanto sua loucura permite. Lutas com moinhos de vento, barris de vinho e encontros com personagens inusitados estão no pacote, tudo dedicado à formosa Dulcineia del Toboso, a princesa que só existe na cabeça do falso cavaleiro. 

Miguel de Cervantes tem uma escrita gostosa de acompanhar. Sem exageros, demonstra seu conhecimento de histórias de cavalaria, da fé cristã e dos deuses e contos gregos. Apesar de ser uma história escrita a mais de quatrocentos anos, é simples de ler. Dentro da história principal, o autor apresenta outras menores que são muito interessantes. Algumas sagas paralelas se entrelaçam a principal quando personagens mencionados são encontrados, fazendo com que o leitor se interesse pelo seu deslinde. Nesse ponto Cervantes também não decepciona, pois tomou o cuidado e a decência de concluir todas elas. 

A figura de Dulcineia é constante em toda obra, funcionando como uma musa para o cavaleiro. Sancho tenta explicar ao seu amo que já ouviu falar da verdadeira Dulcineia que, além de ter outro nome, está muito distante de ser princesa. No entanto, Dom Quixote, que jamais a viu, é categórico ao dizer que sua princesa é o que ele imaginar que ela é. E isso lhe basta.

O segundo volume, muito aguardado e que estou lendo agora, só foi lançado quinze anos depois. 

Em resumo, uma obra pontual, bem escrita, simples, mas não por isso diminuída, que trata de um personagem louco e fantástico, capaz de ver a vida pelos olhos épicos de heróis ficcionais. Cômica também e apesar de longa não se torna maçante. Eu imagino, já que se trata desse tema, que Dom Quixote seria como uma boa séria de TV para a época. Todos queriam ver os próximos capítulos e o fim do nobre cavaleiro. 

Estou torcendo por ele. Fica a dica e a resenha. 
Abraço 
Paul Law

13 de maio de 2020

Respeitável Benjamim grátis



O meu mais recente livro estará disponível gratuitamente na Amazon Brasil a partir de sexta-feira, dia 15 de maio de 2020. É a primeira vez que o e-book Respeitável Benjamim fica gratuito, então aproveitem! A promoção vai até ter-feira, dia 19. 

Vejam a capa do livro:


Sinopse:

Esta é a história de um menino que queria um novo nome que começasse com a letra A. Enquanto pensa sobre o assunto em sua confortável cadeira, recebe a visita de uma amiga que veio para levá-lo para casa. Decidido a não voltar, com o objetivo de mudar a própria história, Benjamim conhecerá personagens fantásticos que lhe farão refletir sobre o tempo, fim e destino.  Respeitável Benjamim é um conto nada convencional que se passa em um palco de teatro, cujos personagens interpretam outros personagens numa alegoria sobre vida e realidade.

Um trecho:

— Hoje uma coisa, amanhã outra! Um botão, uma flor e então pétalas secas. Feridas, cicatrizes! Tristeza, alegria! Dia, noite, meses, anos, décadas, centenas, milhares, eu, o sempre. Seguir, pode ouvir? Tic-tac, tic-tac, o tempo flui. O pequeno Benjamim que não gosta do próprio nome e que tem apenas uma cadeira, permanece preso por muitos anos. Seu crime? Quem liga. Mas Dia e Noite dançam (o tango volta a tocar), o tempo passa e com ele os dias de cárcere. Ele então é libertado, mas já não é mais quem era. Quem é Benjamim agora?

Opinião sobre a obra aqui.

Prévia:

Link de compra:

https://www.amazon.com.br/dp/B07X6FFDSS

É isso aí!
Abraço.

8 de maio de 2020

Dia das Mães atípico

Fonte: Espaço Viva Bem


Aproxima-se o dia das mães, época em que tradicionalmente passamos com nossos entes queridos. Dessa vez, no entanto, não será possível dar um abraço em minha mãe ou levar minha esposa para dar um na dela; nem mesmo perto iremos ficar. Por causa da Covid-19 estamos afastados de nossos parentes e amigos, vivendo em isolamento social. Os dias que antes eram de descanso ou de atividades diferentes das costumeiras, já não são mais assim. É um misto de "o que era antes", já que algumas atividades voltaram, mesmo que a contragosto, com "o que nunca mais será como antes". Não sabemos como nos comportar nessa nova realidade. 

Sei que não sou o único. Vi ator consagrado pôr fim em sua vida; observo pessoas esperando vagas em UTIs para seus entes queridos. Recebo notícia de que muitos falecem nessa espera. A Justiça tem dado liminares para internação, mas não têm vagas, o que faz com que familiares com a ordem do juiz nas mãos, observem dias passarem sem o seu cumprimento. No final, a morte; a triste e injusta morte. São tempo de repensar o que vale mais… 

Não há leitos, não há respiradores, existe pouca esperança para os que contraírem o coronavírus nesses dias. Esta situação calamitosa é nova? Certamente que não, mas não é por isso que é menos impactante e justificativa para que os esforços sejam menores. Se os governantes começarem agora, talvez da próxima vez não aconteça de pessoas perderem a vida esperando; morrer de esperança. 

Os números de mortes no Brasil somam 9.265 (quase dez mil) e os casos confirmados de Covid-19 estão em 137.000. Aqui em Mogi Guaçu as notificações de casos estão em 184, sendo os confirmados em 35 e as mortes em 1. Entretanto, temos 28 exames aguardando resultado e 4 outros óbitos sendo investigados. Como se vê, os números estão aumentando, mesmo que exista pressão para que o comércio volte a funcionar e o distanciamento social seja abrandado. 

Este será um dia das mães atípico, mas temos que vê-lo pelo lado bom: se fizermos tudo certo, teremos a chance de abraçar nossas mães no próximo. É claro, não podemos esquecer daqueles que já não poderão…

20 de abril de 2020

Segunda-feira

Fonte: Vida de home office

Hoje é segunda-feira, véspera de feriado, mas como sabem vivemos como se todos os dias fossem feriado, ainda em isolamento social. Já se passou um mês desde que a Covid-19 chegou em nossas vidas de forma impactante. A verdade é que pouco se fez neste tempo para reduzir o seu avanço ou extinção. O mundo todo busca uma solução, mas nada até agora… Nós já estamos nos acostumando com esta rotina de espera e angustia. É como se a vida estivesse definitivamente enquadrada em telas e lives

Há aqueles que querem retomar suas vidas, voltar ao trabalho e agir como se tudo estivesse bem. Têm outros que apoiam as medidas de distanciamento social a fim de evitar maiores prejuízos e mortes. A taxa de isolamento vem caindo no avanço das semanas, refletindo a impaciência das pessoas com esta situação. Trocou-se o Ministro da Saúde por outro que apoie a retomada da economia, mas ele pouco fez até o momento, seja na saúde ou na esperada economia. O Presidente continua a afastar o foco do coronavírus para ações antidemocráticas. Ele vem apoiando grupos que são a favor da ditadura militar. O que se observa com clareza é que já se passou muito tempo e o brasileiro não viu nenhuma medida concreta contra o mal que estamos enfrentando. Obviamente que destacar outros males não é desculpa para não lidar com o mal atual; pôr a culpa em anteriores ou em adversários tão pouco. 

O número de casos no Brasil está em 39.144, sendo os óbitos no montante de 2.484. Comparando com o do último dia 10, nota-se que eles mais que dobraram. Quando esta curva começará a descer? No mundo os casos somam 2.416.135 e as mortes 165.939, sendo até o momento os EUA como o local de mais impacto da doença (com 41.114 mortes). 

Nós? Bem, nós continuamos aqui na mão de governantes ineficientes e egocêntricos, esperando dias melhores, mesmo que as estatísticas não sejam favoráveis.