15 de dezembro de 2021

Demônio Rico



Entra Rica, trajando um conjunto social branco, camisa negra. Sapatos de salto alto, pretos, o cabelo solto. Ela porta uma maleta luxuosa. Coloca o objeto no colo de Benjamim.

— Aí está — ela começa.

— O que está aqui?

— Abra. 

Benjamim destrava as presilhas laterais da maleta. O compartimento se abre.

— Se tivesse se casado comigo teria todo esse dinheiro para prolongar os seus dias — continua Rica.  

— Nem todo o dinheiro do mundo pode comprar mais dias. Os homens lutam a vida toda para terem riquezas; consomem os dias juntando como já te disse e depois não há tempo para desfrutar. Desse mal, que Famosa não me ouça, tenho orgulho de dizer que não padeço. Nunca fui personagem de dar valor às posses. 

— O dinheiro ainda vai levantar mortos, Benjamim. Já imaginou? Poderia comprar o senhor do seu destino, mudar a história. E se o ato de execução de Isalinda fosse refeito? 

— Por mais que seja tentadora tal possibilidade, o ato está escrito e não se pode mudá-lo. 

— O pobre sempre arranja uma justificativa para sua pobreza; uma nobreza de mendicância, acho que te disse isso antes. Está morto, Benjamim e nem foi preciso esperar a final batida do coração. Está extinto desde sempre por causa da pobreza. Que venha a Certidão de Óbito, embora ninguém ligue. 

Rica fecha a maleta no colo de Benjamim. Agarra o objeto e saí do palco pela direita da plateia.


Trecho de Respeitável Benjamim

30 de novembro de 2021

10 minutos e 38 segundos neste mundo estranho

 


O que pensamos depois que o coração para de bater?

O título do livro de Elif Shafak é "10 minutos e 38 segundos neste mundo estranho" porque é o tempo que o cérebro ainda funciona depois que o coração para de bater. Não é só por isso, claro. O título faz referência aos pensamentos da protagonista depois de ser assassinada até que sua mente se finde completamente. Cada capítulo é nomeado por minutos restantes de vida: "Um minuto", "Dois Minutos" e assim por diante. Ah, tem capítulos que não são minutos e pode ficar tranquilo que depois que acabarem os dez minutos e os trinta e oito segundos o livro ainda continua! 

A história, como já dito, começa quando a vida de Leila Tequila termina em uma lata de lixo em Istambul. Nos minutos que antecedem a morte cerebral da personagem vamos conhecendo suas memórias e sua vida; fatos que a levaram até aquele derradeiro destino  Leila nasceu no sudeste da Turquia, filha da segunda mulher de um patriarca tradicional, mas que só descobriu quem era de fato a sua mãe tempo depois. É que a primeira esposa se passou tomou a maternidade da até então única filha da família para si. E tem muitos outros fatos envolvendo a personagem que culminam na sua fuga para a cidade grande. Ela é proibida de estudar, o pai não a defende depois de ser abusada pelo tio... 

Em Istambul Leila conhece outros párias como ela; pessoas que buscavam uma vida nova, distante do preconceito e do sofrimento que viviam em suas terras natais. Na vasta cidade, no entanto, a vida não é fácil e ela se vê imediatamente engolida pelos aproveitadores que a fazem uma garota de programa. O primeiro prostíbulo é ruim, o que a faz buscar melhores condições, mudando de local de trabalho e aprendendo como a cidade realmente funciona. O mesmo pode se dizer de seus amigos e de seu amor.

Shafak tem uma narrativa coesa, focada nas minorias e nas engrenagens suburbanas da grande cidade turca. Explica como os invisíveis vivem nesses lugares. Ah, e se passa em um período histórico conturbado!  Através de Leila vamos aprendendo como os sonhos são desfeitos, renascem e terminam numa lata de lixo. Bem, há a segunda parte da história que conta a resignação desses seres, as lutas para que pelo menos o fim seja digno. A autora diz em suas notas que as personagens do livro são fictícias, mas baseadas em histórias reais, o que fica bem claro para o leitor. Apesar de começar com morte, "11 minutos e 38 segundos" tem muita vida. 

Resumindo, um livro criativo desde o título que joga luz em uma parte escura da sociedade. Fala de preconceitos, de vidas tidas como insignificantes, mas cheia de valor e verdade. Se tem um ponto que vale uma crítica, seria sobre os responsáveis pelo que ocorreu com Leila Tequila. Esta parte é pouco explicado na história, embora, talvez, seja esta a intenção da autora. Que diferença faz saber mais dos assassinos se a vítima não importa à sociedade? De todo modo, eu queria saber mais... 

Fica a resenha e a dica de leitura. Vale a pena! 
Abraço.             

26 de novembro de 2021

Um



O carro vale um, assim como a casa, a TV, a cama, o celular. Ora, não era de se esperar diferente, pois um deve valer um preço. O trabalho de uma pessoa é remunerado por dia de trabalho. Compraria ela qualquer coisa que fosse única pelo preço do seu dia, afinal todo dia é único. Assim seria para tudo; uma noite de descanso; uma viagem; uma mãe; um pai. Obviamente que nem tudo há de ser único. Para essas coisas teríamos o dinheiro. 


     

17 de novembro de 2021

Arte em Movimento em Mogi Guaçu

Aconteceu no dia 7 de novembro de 2021 a entrega do 7º Troféu Arte em Movimento aqui em Mogi Guaçu. O evento se deu nas dependências do teatro Tupec no Centro Cultural da Cidade, homenageando o cantor e compositor Armando Moreli. Sim, o troféu deste ano levou o nome do talentoso músico. 

Com o apoio da Secretaria de Cultura, sob o comando do Jamelão e do Zep, o criador do prêmio, muitos artistas da nossa cidade e da região foram homenageados. Fátima Fílon, Marcos Cunha, Rosely Rodrigues, Olivaldo Junior, Diamantino Gaspar, Ubaldino entre outros receberam o troféu. Eu também! 

Ah, entidades culturais também foram lembradas, como a Academia Guaçuana de Letras que foi homenageada na pessoa de seu presidente Luís Braga Jr. O CUCA, o Coletivo Cultural foi lembrado na pessoa de seu representante o Rodrigo Peguin. 

Teve apresentação de balé e música com o próprio Armando Moreli, além dos Inspirados Rap Nascional. Outros artistas deram sua contribuição ao evento com suas palavras e performance. 

Ah, minha filha Bárbara também foi lembrada e fica aqui o meu agradecimento à Comissão Julgadora do Arte em Movimento pela lembrança tão importante para ela e para mim. Quer ver algumas imagens?












Fica o registro e o agradecimento!

Abraço. 

5 de novembro de 2021

Demônio Vaidoso



Entra Vaidosa, agora vestida com um luxuoso vestido negro. Um extravagante chapéu e véu. Aproxima-se, chorando. Diz:

— Se eu tivesse sido eleita seria a mais bela das viúvas. Ao final deste ato choraria por ti por sete dias e sete noites. Todos comentariam de mim: ali vai dona Vaidosa enviuvou-se de Benjamim e sofre muito. Tão jovem e bonita, a pobrezinha. 

— Quanta bobagem! 

— Bobagem? E o seu caso? Aqui ficou Benjamim, aquele que sofreu a perda de Isalinda. Como sofreu e sofre o homem! O seu sofrimento é único! Não há outra alma que padece tanto. Ele se pergunta: por quê? Há Justiça? Não! Claro que não. Fora por toda vida um bom homem; temente a Deus, cumpridor de seus deveres, trabalhador. Nem palavrão proferiu. Mesmo assim perdeu tudo. Ele está cansado, mas ainda tem medo. Quer continuar sendo Benjamim mesmo depois; depois do fim... Não aceita dormir; não acredita que um dia o mundo seguirá em frente e ele nem será lembrado. Talvez uma foto no fundo de uma gaveta; um olhar triste de alguém que o conheceu. Depois este alguém também alcançará o último dia. Eu sou o seu demônio vaidoso; sua singularidade. Você não quer deixar de ser o que é, mesmo sabendo que é inevitável. 

— Tens razão. Eu deveria ter te escolhido como esposa. Talvez estivesse em paz agora.

— Pois então, mas agora é tarde. Tempo não volta, cada dia é único; cada minuto! Eu me vou, mas outros cinco demônios ainda vão te visitar antes do derradeiro momento. Aproveite cada segundo... 

Vaidosa pede ao público uma salva de palmas. Ele obedece e ela sai de cena após uma reverência de agradecimento.


20 de outubro de 2021

O Artesão


 

A primeira coisa que fez Artesão foi conceber o Relógio. Ele criou doze reinos que chamou de Hora; dentro desses reinos, criou povoados sob o nome de Minuto que, por sua vez, foram divididos em cada propriedade chamada Segundo. Assim, deu a cada humano um pedacinho de terra, dentro de um monte maior que se dividia em doze iguais.    

No entanto, alguma coisa, cuja explicação lhe fugia totalmente, fez surgir rei de determinada Hora ou general em outra. Minuto ocupado por um dono e Segundo sendo anexado a outro, formando grandes propriedades e humanos submissos. Tal fenômeno por carecer de melhor definição ficou conhecido como guerra. Aquilo que além de imprevisto, fugia-lhe do controle, reorganizava sua obra de um modo desigual e injusto. Matutou se ao final de muitas guerras sobraria mais de uma Hora. 

Após constatar o fracasso do primeiro projeto, o criador pensou em um modo de evitar novas guerras. Não seria justo dar ao dono de algum Segundo uma maneira de se defender ainda que seu opressor fosse mais forte do que ele? Criou, então, espadas, escudos, facas e rifles que disparavam um projétil. Repartiu a criação entre os dominados. Mais uma vez, contudo, o engenho humano surpreendeu-lhe. Reis e generais estudaram as criações de Artesão, as tomaram para si e as melhoraram, concebendo espadas mais afiadas e armas de fogo capazes de disparar vários projéteis; canhões que derrubavam castelos. Aprenderam a usar cavalos para se moverem com mais rapidez. 

Notando que suas tentativas de criar no fim viravam destruir, decidiu abandonar o ofício e se estabelecer em um Segundo qualquer (um que ainda fosse pacífico). Escolheu o Trigésimo Quarto Segundo do Décimo Oitavo Minuto da Quarta Hora para construir uma humilde casa e manusear a terra, imaginando ser ela, ao contrário da humanidade, segura. Vivia bem, esquecendo-se do que, por sua culpa, acontecia ao redor até o dia em que viu Nara na propriedade vizinha. 


Baixe o conto completo gratuitamente aqui

15 de outubro de 2021

Sobre o medo


 

— Bem, é uma proposta tentadora. O único problema é que tenho um pouco de medo. Acho que um tiquinho de receio não faz mal a ninguém. Ser prudente, não correr riscos desnecessários... 

— Que graça há em viver cauteloso? 

— Nenhuma, tem razão. É que o medo é uma defesa da gente; um modo natural de proteção. Dois são os maiores objetivos de uma existência, a senhorita terá de me dar razão. Um deles é o da sobrevivência, o outro o da procriação. Somos como plantas: nascemos, crescemos, damos sementes e morremos. Até que tudo isto seja feito, precisamos nos manter vivos, daí a necessidade da autopreservação, do medo. 

— Devo discordar. Não tenho filhos, nem vontade de tê-los e não me acho descumpridora do destino da humanidade. Sou uma gloriosa guerreira que busca companheiros de aventura! 

— Certamente. Quando disse que são dois os objetivos da vida humana, fiz distinção desnecessária. Na verdade, é apenas um; é que o outro está dentro deste um. O único propósito humano é a sobrevivência. A procriação é uma forma de sobreviver, concorda?

— Não sou uma mulher de filosofar, senhor. Temos pouco tempo e sei que negou todas as outras pretendentes porque esperava uma que fosse especial; uma que fosse como os heróis dos livros que tanto gosta de ler. 

— Não seria má ideia experimentar um pouco de aventura mesmo sem casamento.

— Ouço o trotar de cavalos; os gritos de homens, o tilintar do aço de espada! Espere-me Alexandre, pois logo estarei contigo!

8 de outubro de 2021

Revelações de Maria Falsa


Maria Falsa se sentou à sombra de uma árvore e pediu aos seus amigos que fizessem o mesmo. Todos silentes, a mulher começou dizendo que depois do nascimento ela e suas duas irmãs cresceram felizes sob os cuidados da rainha Helenna. Conforme os anos avançaram coisas novas começaram a ser observadas no reinado. O rei Mario foi um dos primeiros a notar a mudança de seu corpo, a alteração da coloração de seus cabelos. Consultou Flora e ele lhe explicou que aquilo era normal, que tal qual as plantas, os seres humanos mudam. Nascem, desenvolvem-se e perecem. Informou ao rei que aquilo era uma consequência do nascimento de Morte; que em breve ela teria o seu próprio reino, e que até mesmo o rei seria um dos seus súditos um dia. O pai de Maria Falsa pouco compreendeu e até achou conveniente que sua filha fosse rainha. Outra novidade, esta atribuída a ela Maria Falsa, foi o surgimento da capacidade de mentir e com ela grande confusão. Como, agora, podiam dizer algo que não havia acontecido? Que mágica havia no mundo, capaz de conferir a incrível habilidade de inventar uma história que jamais se concretizou? Flora explicou ao velho rei que aquilo também era natural e que sem a imaginação a vida seria muito chata; que mentir pode ser bom em alguns casos. Outra vez o rei se viu confuso e já começava a se arrepender de ter pedido ajuda ao sábio para concepção de suas filhas. Então, veio a terceira e última consequência: a Justiça. Sim, atribuída à Julia, a Justiça fez com que os súditos passassem a pensar mais nos outros. Levassem em consideração se seus atos não prejudicariam outras pessoas; se podiam roubar, agredir, realizar guerras. Mais uma vez, Mario foi ter com o seu sábio e Flora lhe disse que este era o melhor dos nascimentos! Com a Justiça no mundo, tudo seria dividido corretamente e não faltaria nada a ninguém.

Os anos foram ensinando Mario e Helenna a lidarem com suas filhas e as mudanças. O mesmo se via com os súditos e soldados. Mentiam com naturalidade, mas apenas quando a verdade fosse causar dor a alguém. Condenavam assassinatos que, descobriram, povoavam o reino de Finda. Aqui é preciso explicar que o reinado da jovem filha do rei se deu em terras invisíveis aos olhos dos vivos. Segundo a menina, tratava-se de um local muito parecido com o reino de seu pai, no qual ela reinava soberana. Quem chegasse aos seus domínios, em regra seria incapaz de deixá-lo. Se o deixasse, não podia dizer aos vivos como era estar no Outro Mundo, sob pena de exílio no Vale do Esquecimento. O esquecimento, por sua vez, era a pior das coisas que poderiam acontecer a um morto, já que lhe custava a existência. A verdade é que com o avanço do tempo, Finda Perecida foi se distanciando dos seus parentes, permanecendo quase que exclusivamente em seu próprio reino, cuidando de seus afazeres.

Então, chegou o dia do passamento da rainha Helenna, mãe de Maria. Certamente o dia mais triste de todos. Como aconteceu? Bem, Maria Falsa não sabia descrever os detalhes, pois a mãe morreu dormindo e Finda não lhe contou nada. Julia não achou justo e se perguntou por que as pessoas que amamos tinham que nos deixar. Não era coerente que algo assim fosse possível. Maria percebeu que a relação entre os membros de sua família ficou abalada após a tragédia, já que seu pai culpou sua irmã Morte pela perda da esposa, acusação que Finda não se preocupou em rebater. Limitou-se a dizer que em breve o pai se juntaria a esposa; era inevitável que todos se tornassem seus súditos um dia, sendo ela a maior rainha de todas. Que terrível filha Morte se tornou, confessou Mario certa vez. Que triste sina esta que veio ao mundo através dos galhos secos daquela maldita árvore gerada pela semente de Flora! Como o esperado, Finda Perecida passou a não ser bem-vinda no reino do pai, tornando-se Julia a preferida do monarca a suceder-lhe ao trono. Era preciso, no entanto, encontrar um marido.


Trecho de Ester 4ª edição. 


22 de setembro de 2021

A Vida Secreta das Árvores


Árvores têm internet

Não acredita? Peter Wohlleben engenheiro florestal e autor de "A Vida Secreta das Árvores" vai te provar que as árvores fazem muito mais coisas do que imaginamos. 

Wohlleben trabalhou muitos anos em uma reserva florestal, observando o crescimento e desenvolvimento da floresta ao seu redor. A curiosidade sobre o assunto o fez estudar os tipos de árvores existentes e suas peculiaridades. Tudo isso rendeu o material para "A Vida Secreta das Árvores" um livro voltado para o público comum com a intenção de despertá-lo em relação a preservação da flora de forma geral. 

É pelas palavras do engenheiro ambiental, obviamente baseada em dados técnicos, que aprendi que uma árvore plantada por mãos humanas é bem diferente da que existe na natureza. Em outras palavras, o reflorestamento não é suficiente para devolver a floresta o seu estado de antes do desmatamento. É que as florestas nativas funcionam em conjunto; as árvores de uma floresta entendem que são um coletivo e dividem nutrientes e informações entre si para preservar o todo. Não é o máximo? Quer saber outra? A floresta replantada não tem esta capacidade.

Os fungos formam uma rede fininha que conecta boa parte da floresta pela qual as árvores recebem informações sobre chegada de chuva forte, frio intenso ou incêndio. Eis aí a internet delas! E tem mais: uma árvore doente recebe das companheiras energia extra para poder se curar e continuar vivendo. A vida de uma árvore é bem mais longa do que a dos homens ou animais, isso todo mundo sabe. O que é novidade é o fato de árvores de cidade viverem bem menos do que suas irmãs da floresta. No solo urbano as árvores sofrem muito e são comparadas aos moradores de rua! 

O autor ainda apresenta dados que dão a entender que as árvores se comunicam, chamam ajuda, se juntam para aproveitar melhor os raios solares. Um dado triste é que provavelmente uma árvore sente dor quando é podada. É como se um braço lhe fosse arrancado. O tronco também diz muito sobre a saúde da árvore e se descascado pode causar a sua morte. 

Ah e as árvores são preconceituosas! Uma espécie não gosta da presença de outra. Elas entendem que o outro tipo tomará o seu espaço e faz de tudo para evitar o crescimento do inimigo. Tem árvore que usa nutriente de outra para ficar forte e depois matar quem lhe cedeu energia, crescendo entre galhos até alcançar a altura suficiente para ficar com todo o sol e deixar a outra sem energia. 

Tem muitas informações interessantes sobre o mundo das árvores no livro resenhado. Leitura simples, direta e de muita qualidade. Tema em evidência pouco explorado. Eu espero que chegue o dia em que as árvores sejam tratadas como os seres vivos e importante que realmente são!

Fica a resenha e a dica.

Abraço.             

15 de setembro de 2021

A verdade não é boa


— No que está pensando? — pergunta Má, aproximando-se. 

— Apenas na música. O som sempre me pareceu importante. Passos, passarinhos, violino. Um tapa; o vento nas folhas ou as folhas no vento. As coisas costumam reagir com barulho quando são tocadas. Um defeito grave que os livros possuem é este: falta de som. Seria incrível se houvesse um livro musicado, não concorda? 

— Verdade, sons são especiais. Penso no barulho de um corpo estatelando no chão; ossos quebrando.

— Quem é você que é tão pessimista?

— Sou a Princesa Má, aquela que foi deixada de lado por você e sua amiguinha Corajosa. Que ficou sem se apresentar e te propor casamento. 

— Bobagem. Cá estou em tempo de te ouvir. 

— Pois bem, eu sou sua melhor opção, veja só. Sou realista, franca e direta. Os melhores homens gostam dessas qualidades. 

— Não posso discordar. 

— Todas as pessoas são essencialmente más, mas fingem o contrário. Eu não. Deixei de fingir, assumi o que sou e desde então vivo contente. Se me permite, você também deveria fazer o mesmo. Assumir que não é normal; que tem problemas. Admitir algo é o primeiro passo para superá-lo.

— Talvez tenha razão. 

— Claro que tenho. A verdade não é boa. Verdade é verdade. Case-se comigo e toda esta confusão terá fim. O espetáculo chegará ao ato final sob palmas e excitação. Mesmo o melhor dos atores precisa se despir de personagem uma ora ou outra, não é?


Trecho de Respeitável Benjamim

26 de agosto de 2021

O lugar das coisas no mundo


As luzes se apagam de uma vez. Vozes da plateia são ouvidas. Primeiro moderadamente, depois mais alto. Alguns espectadores se levantam, está quente. É o fim? Um holofote se acende sobre a cadeira vazia no centro do palco. Passou-se tempo demais? 

Entra Gaspar, o policial do primeiro ato. 

— Aqui está ela — aponta para a cadeira. 

As luzes totais do palco se acendem. Gaspar se volta para o público. Fala:

— Depois que eu saí de cena, após conversar com Benjamim criança e prendê-lo, percebi sua esperteza e quis eu também me tornar culto. Fui ler e aprender para voltar e debater com ele, mas ao que parece, o jovenzinho sumiu. Sabem dele? 

Gaspar se senta. Continua:

— Já pensaram sobre o lugar das coisas no mundo? Tomemos por exemplo esta cadeira que cá está desde o início e que é muito confortável. Acham que ela está posicionada corretamente? Cadeira sabe que é cadeira, feita de madeira, montada pelo engenho humano para servir de assento? Eu penso que não e a acho feliz por ser assim. Já Benjamim é diferente, concordam? Ele sabe de onde veio e para onde vai, mas não é feliz. Então, talvez, só talvez, saber certas coisas nos causa tristeza. Saber que morreremos...


Trecho de "Respeitável Benjamim"


18 de agosto de 2021

É isso que as árvores fazem


Elisa chegou ao quintal em que se localizava Bernardo. Era tarde naquele espaço amplo, perto de um córrego de uma linda chácara. A família da adolescente residia ali sem pagar aluguel em troca de manter o local limpo para os patrões que só visitavam o lugar nas férias.

— Vamos continuar falando sobre conhecimento? — ela começou.

— Pois não — respondeu-lhe a árvore.

— Frequentei a escola, você sabe. Lá aprendi a fazer contas, a escrever palavras e o funcionamento do corpo humano. O das árvores também. Não acha importante saber todas essas coisas?

— Depende. No presente você usa as contas? Escreve palavras?

— Hoje falo com árvores.

— Pois então só precisa saber falar com árvores, Elisa. Eu, por exemplo, só sei ser árvore. Todo dia sou árvore.

— Já te disse que simplifica demais as coisas. Não sabe como é ser uma pessoa, Bernardo! Não tem como saber como é ser Elisa. Eu vou continuar mudando, crescendo.

— Ora, eu também mudei, cresci.

— Não dá pra ter uma conversa séria com você. Como irei ser professora se não estudar, aprender a dar aulas?

— A técnica é necessário para ser professora isto é bem claro para mim. O resto é que se torna um problema. Um defeito.

— Que resto, criatura?

— A lembrança dos dias que se passaram. O que te machucou, o que te deu alegria, o brinquedo ganhado o outro quebrado. Os exemplos bons, os ruins.

— Não vejo defeito nisso.

— Quando algo novo acontece, você busca na sua caixa de memórias a resposta para lidar com a novidade. Preenche o novo com velho e vive uma vida todo assim. No final estará sempre no passado até ser tarde demais.

— Não é bom buscar no já vivido a solução de um problema? Vou além, projetar dias melhores com base no conhecimento adquirido?

— Não, Elisa. Toda chuva é nova e a aproveito quando ocorre. Cada pingo cai de forma diferente no solo, tem peso e tamanho diverso. Não os comparo com pingos antigos nem tempestade passada para me preparar para chuvas novas. Como já te disse eu só sei árvore e é isso que as árvores fazem.


6 de agosto de 2021

Fins e começos



— Entendo, mas me nego. Prefiro matutar sobre coisas que simplesmente não compreendemos. Tens um nome? Poderia me dizer? 

— Pois não, chamo-me Gaspar. 

— Pois bem, senhor Gaspar, pense comigo: quando exatamente começa a vida?

— Que tipo de pergunta é essa? Que importa saber quando? 

— O senhor há de me dar razão de que o feto vive na barriga de sua mãe.

— Que diferença isso faz, menino?

— Saber quando algo começa ou termina é fundamental. Nosso cérebro funciona assim, não percebe? Fim do primeiro ato, início do segundo. Acabou o capítulo treze, iniciou-se o quatorze. O problema é que acho tudo isso bobagem.

— Se acha isso por que me aborrece com o assunto? 

— Penso que uma coisa vai aos poucos se transformando em outra; vida paulatinamente vai se tornando morte. O senhor está morrendo, nota? Eu estou e isso me entristece. Embora tal qual o início, não se sabe, ainda, precisar o fim da vida, todos sabemos que ele chegará. Só podemos afirmar que chegou depois que passou. 

— O que fazer, então? 

— Eis aí um grande dilema. Conhece a palavra dilema, não? Aquele termo que significa “sem saída”; um problema que qualquer solução possível é ruim. Para estes casos, penso que não há remédio.


Trecho de "Respeitável Benjamim"


28 de julho de 2021

Homenagem aos escritores na Feira do Livro de Mogi Guaçu

 Está rolando na Praça do Recanto, desde o dia 23 de julho, a Feira do Livro de Mogi Guaçu. Tem uma tenta bem grande lá com uma livraria completa! Ah, alguns escritores daqui da região também estão expondo e vendendo seus livros no local. O evento vai até o dia 14 de agosto de 2021. 

Lá na Feira do Livro, no domingo, 25 de julho, dia do Escritor, a Secretaria de Cultura preparou uma bela homenagem aos escritores de Mogi Guaçu. Foi entregue a eles o Certificado de serviço e dedicação à Arte Literária. Este reconhecimento por parte do Poder Público local, mostra sincera preocupação e cuidado com a Cultura da nossa cidade, sobretudo com a Literatura. Aqui temos escritores de várias idades e gêneros e todos eles foram lembrados pela equipe da Secretaria de Cultura. Isso é muito bom!

A Academia de Letras de Mogi Guaçu também foi lembrada na pessoa de seu presidente Luís Braga Jr que, por sua vez, fez questão de lembrar de todos os membros, indicando-os para a homenagem. Eu estava lá! 

Veja algumas fotos que peguei emprestado do escritor Carlos Pinheiro:



           







Não é o máximo? Fica aqui registrado o meu agradecimento à Secretaria de Cultura de Mogi Guaçu na pessoa do secretário André Sastri. Agradecimento a toda equipe da Secretaria que preparou a homenagem e o evento tão importante. 

Até o dia 14 de agosto dá tempo de você conhecer a Feira, vem?

Abraço! 

21 de julho de 2021

As Cinco Colinas - Arlene Padrão


 Qual delas você subiria primeiro?


Sua escolha seria a colina da saudade, do arrependimento, do medo, do sonho ou do futuro? Ficou curioso? Pois não fique! Vou contar tudo sobre "As Cinco Colinas" da escritora Arlene Padrão, livro lançado em junho deste ano. É o primeiro romance da escritora natural daqui de Mogi Guaçu/SP e membro fundadora da Academia de Letras de Aguaí/SP. Ela tem outros livros já lançados, os infantis "O Saci-Cor-de-Rosa", "Um Rabisco no Céu", "Cabeça de Lua" e "Aguaí - Uma Lenda". Ah e tem "O Trem do Tempo" que já resenhei aqui.

A história começa com a apresentação dos personagens principais: o Velho, um senhor que vive isolado em uma humilde casa no campo e Pirata, o seu fiel amigo canino. Vamos conhecendo a rotina dos dois simples amigos e compreendendo que, embora humilde, Stanislaw (o Velho) tem uma vida de trabalho e paz. Bem, essa paz é perdida quando ele inventa de subir alguma colina e revirar suas memórias. O pobre Pirata com seu raciocínio simples, para não dizer correto, faz sua própria reflexão sobre o que escuta. O Velho é solitário, de poucas palavras e de visitas esporádicas à vila, apenas para comprar mantimentos básicos. Ele tem muitos segredos que o leitor vai descortinando conforme avança na leitura. 

Nos passos de Stanislaw podemos observar os de qualquer pessoa que tem vários anos vividos. Mais que isso, compreendemos que a vida deixa marcas e que superá-las é necessário para aproveitar o tempo final. É uma lição sobre encarar a si mesmo e terminar em paz. 

É claro que a Arlene Padrão não fica apenas no Velho. Ela explora o sítio e seus personagens, certas lendas ou boatos  interioranos e descreve um pouco da rotina de ciganos É uma história de histórias de vida. E se tem um problema, se posso chamar assim, é o tamanho. Achei que o Velho tinha mais coisas para contar; que haveria encontros esperados. As colinas, alegarias sobre os sentimentos, são muito interessantes e mereciam mais subidas e decidas. 

Em suma "As Cinco Colinas" é um bom romance de estreia. Tem começo, meio e fim bem delineados e ensina. Pode ser curtinho para os mais empolgados como eu. 

Fica a breve resenha e a dica de leitura. 

Abraço.    


Ainda está aí? Que tal comprar o livro resenhado na Amazon?

É só clicar aqui. 

6 de julho de 2021

A Pedra que era palhaço



Era uma pedra como outra qualquer sobre o chão no meio de um terreno sem atrativos. Diziam que ali, antigamente, havia uma casa. Para a menina observando o homem cuidar da pequena horta que ocupava o canto das terras, a pedra era uma parte dessa casa destruída. Não era só: a pedra tinha cara de palhaço. Como assim uma pedra com cara de palhaço? Muito simples: para a menina que tinha olhos de arte era bem fácil ver o que não estava tão evidente. E ela via! Além de palhaço, enxergava onça; via caveira (que achou horripilante!). Não era de propósito, mas acontecia sempre. Quando alguém lhe chamava o nome, aterrissava no terreno. Vinha do Mundo da Lua. 

23 de junho de 2021

Todas as pedras caem?



— Estou confuso. Pouco entendo dos seus dizeres... 

— Não me surpreende já que é adulto. Parece-me difícil aos adultos compreender as crianças e imagino o motivo. Eles são previsíveis. 

— Como é?

— Sim. Pense comigo, já viu gente grande acreditar em Papai-Noel? Posso dizer com cem por cento de certeza que todos os adultos não acreditam na existência do Papai-Noel. 

— Todos sabem que Papai-Noel não existe. 

— Aí é que está o erro. Como pode dizer uma coisa dessas sem antes ter procurado em todos os cantos do mundo? Vai que em alguma caverna no Himalaia encontre o bom velhinho; no coração da Floresta Amazônica! Será que todas as pedras são atraídas pelo chão? Testando todas elas, não encontrarei uma que flutue?


14 de junho de 2021

Todo esse Tempo


Todo esse tempo e era isso?

Sabe aquele livro meio maluco que tem um enredo envolvente? Que tem uma história mirabolante, adolescente e surpreendente? Pois então! "Todo esse Tempo" escrito por Mikki Daughtry e Rachael Lippincott é exatamente assim. Pelo que pude observar os autores já são conhecidos por histórias românticas doidas. Eles possuem um livro chamado "A Cinco Passos de Você" que se tornou best-seller nessa mesma pegada. 

Todo esse Tempo conta a história de Kyle que namora há muito tempo com Kimberly e deseja dar um passo decisivo na relação. O que o adolescente não sabe é que sua namorada tem outros planos para depois da formatura do Ensino Médio. Quando ele descobre, briga com ela. Sai nervoso da festa de formatura, ela vai atrás. Eles entram no carro e sofrem um grave acidente.Louco não é? Isso é só o começo! Kyle fica gravemente ferido, mas quem leva a pior é Kimberly que perde a vida no acidente. A partir daí o adolescente veste o luto, repensa toda a sua vida e tenta superar a tragédia. Não é fácil e ele pensa que não vai conseguir. Até conhecer Marley...

Só para contar mais um pouquinho do enredo, Kyle encontra Marley pela primeira vez no cemitério quando visitava o túmulo de Kim. Essa estranha curiosidade é a ponta do iceberg sobre a nova paixão do protagonista. Ambos vão se apoiar um no outro para superar tragédias. Quando tudo caminha para um desfecho feliz, os autores mudam completamente o rumo da história. Kyle perde Marley para sempre... Será?

Bem, os autores de Todo esse Tempo se esforçaram para surpreender seus leitores e até conseguiram. Nem de longe você vai conseguir acertar o que acontece nas páginas da obra se não lê-la. Isso é bem legal. No entanto, todo esse esforço para escapar do previsível, do natural tem lá seu preço. Há momentos em que a história se torna forçada, programada e com explicações que não são coerentes. Pode ser que eu não tenha entendido direito, mas alguns encontros desconsideram outros e vira bagunça só para dar aquele efeito romântico à trama. 

O que não dá para negar é que você vai ficar curioso para descobrir as coisas. O segredo de Marley, o do melhor amigo de Kyle e do próprio acidente do começo da história. Com texto simples, objetivo e bem dosado os autores concebem uma história romântica adolescente interessante. É mirabolante, verdade, mas entretêm. Li rapidinho e gostei.

Leia também e saque o trocadilho infame do nome do livro. Fica a dica e a resenha.  

Abraço.                

10 de junho de 2021

Amor


O amor não pode ser desejo de uma pessoa em relação a outra; não pode ser vontade de ficar com alguém ou intenção de constituir família. Isto são coisas que fazemos pensando em nós mesmos. Nossos desejos, nossa felicidade, nosso medo.    

Obviamente, amor é totalmente contrário à guerra; devoção à nação, a ideias e ideais ou a ídolos. Porque amor não faz divisões; nada de classes sociais, de fronteiras entre países, cores, origens, gêneros. 

Quando ficamos um tempo admirando os olhos da pessoa que está ao nosso lado ou sorrimos por sorrir. Ao sermos chamados de pai pela primeira vez; estar presente e esta presença dar segurança ao outro. Se estamos desanimados e alguém nos motiva. Essas coisas são um pouquinho de amor.   

Amor não se encontra, não se busca, não se tem. Amor é. Ser amor ainda é o desafio que enfrentamos. Que possamos ser amor hoje. 


18 de maio de 2021

Um Girassol na Janela de Ganymédes José

 

Santarema vai salvar o mundo! 

Você sabia que Ganymédes José, o autor de "Um Girassol na Janela", nasceu em Casa Branca/SP? Pois é, nasceu e isso é muito legal. Ele foi um conhecido autor do Brasil nos anos 70 e 80, tendo muitos livros publicados. Infelizmente faleceu aos 54 anos de idade, em Casa Branca mesmo, quando se preparava para lançar mais um livro, o "Uma Luz no Fim do Túnel".

"Um Girassol na Janela" é um livro infatojuvenil que narra as aventuras de Viviane, Vivinha para os mais íntimos, que passa a morar com o pai após o falecimento de sua mãe. Isso não acontece imediatamente, claro. Primeiro acompanhamos Vivinha morando com os tios Chico e Emília e os primos Vá e Cá. É para eles que ela conta a história de sua super-heroína Santarema e seu parceiro Helianto que vão salvar o mundo da poluição, cobiça e outros males que conhecemos bem. A menina tem fascínio por girassóis, pois acredita que eles são antenas que mandam sinal para Santarema ajudar as pessoas. Quando Viviane se muda para a casa luxuosa do pai em São Paulo é que a história começa pra valer. No estilo Pollyanna de ser Vivinha vai mudando a vida das pessoas que conhece, incluindo o pai, um médico rico e solitário.     

Ganymédes José tem um texto gostoso de ler. Bem daquele jeito que gostamos quando estamos desenvolvendo o hábito de ler. Vivinha é criativa, imaginativa e cheia de vida; vai transformando o ambiente em que vive com naturalidade, enfrentando o novo e vencendo desafios. O doutor Camargo também evolui ao longo da história, passando a se entender realmente como pai. Também compreende sua solidão... 

Eu não quis deixar o livro até vê-lo terminado. A indicação de leitura foi da minha filha de onze anos que adorou lê-lo. Um livro simples e bem escrito Ah, o final tem uma revelação muito interessante. Que tal ler também para descobrir? 

Fica a resenha e a dica.                

7 de maio de 2021

Força de mãe


 

A minha mãe é a pessoa mais forte que conheço. Ela mede mais ou menos um metro e meio, tem mais de meio século de vida, não faz musculação, tem dores nos pés, mas, ainda assim, é muito forte. É que força, para mim, não tem a ver com capacidade de agir sobre alguma coisa; de forçar algo a ser o que ele não é ou permanecer onde está. Forte é aquele que suporta o que é e o que está.  

Refletindo melhor, posso dizer que minha esposa também tem esta força. É dela a capacidade de se adaptar, de se doar, de ser gentil; de ensinar com exemplos; de dizer muito com poucas palavras. 

São presenças sutis que confortam.    

Observando estas duas pessoas no dia a dia, estas habilidades, posso imaginar que isto seja amor, qualidade de mãe.

5 de maio de 2021

ENE orelhudo chegou

 O exemplar do meu livro "Extraordinário Novo Eu" acabou de chegar. A novidade é que ele agora tem orelhas, vejam só:







Não é o máximo? 

Você pode ter um desse comprando aqui.

Tem a versão e-book aqui.

Um abraço!