1 de setembro de 2015

Tomo XV - Os novos bandidos


Xamã conduziu a Tenda até outra parte do deserto nos dias seguintes. Sua alegação foi de que já era possível identificar a comitiva dos bandidos por causa das ações anteriores. Tudo chegava à capital. Não estavam preparados para uma investida de lá. 
O procedimento para transformar pessoas em bandidos avermelhados se deu logo que se instalaram. Damian, Bruce e Xamã se reuniram numa tenda afastada e entraram num acordo sobre quem merecia a promoção, enquanto Mae Dickson ficou do lado de fora. Duas pessoas foram eleitas: Joe S. Carter e Tomas Sandler. O primeiro era um domador de cavalos da Capital, enquanto o segundo era dono de um bar em Aquária. Ambos estavam no bando há mais de um ano. Damian ficou de treinar Carter e Bruce, Sandler. Xamã continuou com Mae. 
Os dias seguiram tranquilos, apenas com treinamentos, até que numa tarde fria Mae teve uma conversa peculiar com o mestre. Eles acendiam uma fogueira para o jantar naquela oportunidade.
— Ele gosta de você. É o jeito dele. 
— O que está falando, Xamã?
— Bruce.            
— Ele me culpa. 
— Você não se culpa? 
— Depois que o vi em ação, passei a pensar nisso de outra forma. Ele é tão sério; íntegro. Não sei do passado dele, mas algo me dá a certeza de que é um bom sujeito. Quando estamos perto tenho vontade de pedir perdão por minha atitude. 
— Você está apaixonada, menina. Já pensou em amor? Amar faz as pessoas melhores. É o que tínhamos antes da Lei do 30. 
Mae cutucou a madeira em chamas para espalhar o fogo. 
— Como é? 
— Quando amamos só pensamos em fazer o bem à pessoa amada. Deixamos de lado até mesmo nossas intenções particulares. Entretanto, não podemos amar verdadeiramente todas as pessoas. Então havia um código que simulava o amor. 
— Continuo sem entender, Xamã. 
— Lei, Mae. A lei exigia que tivéssemos atitudes de apaixonado, embora não estivéssemos. Você não mataria seu namorado, mas mataria um policial. A lei dizia que era proibido matar independente de quem fosse. Percebe? Ela simula um amor que você não pode ter em relação a um inimigo. 
— Começo a compreender. Então antes da Lei do 30, esta regra de sobrevivência individual, havia simulação de amor? E funcionava? 
— Bem, em alguns casos. O fato é que você ama Bruce Parker e isso já é o suficiente para funcionar com você e ele. 
Após o jantar todos se recolheram. Mae não podia dormir sem ter com Parker sobre os dizeres de Xamã. Dirigiu-se até a tenda do caubói e entrou silenciosamente. Um cano frio foi encostado em sua testa. O som do cão sendo puxado. A arma sendo recolhida, um palavrão. Um beijo. 
A chama da pequena vela tremulava diante dos olhos de Mae quando Bruce a abraçou carinhosamente. Ela sorriu: 
— Acha que ele está vivo? 
— Ele quem?
— O meu filho. 
— Talvez. Lembro que o deixamos em Liandra. 
— Você iria comigo buscá-lo? 

Bruce derrubou a bituca no chão. Ainda pensava na pergunta de Mae Dickson, embora ela já tivesse ido embora. Suspirou. Remexeu em sua velha bolsa e tirou dela um aparelho eletrônico. Puxou uma antena, apertou uma tecla e uma telinha se acendeu em azul. 
— Como ela está? — indagou.
— Ótima, Parker.  
— Eu juro que se você fizer alguma coisa a ela, eu acabo com você! 
— Fique tranquilo, afinal temos um trato não é mesmo? Prepararei uma grande surpresa para breve — ele interrompeu a ligação. 
É preciso dar esperança ao povo. Eles devem acreditar que é possível alcançar certos objetivos. A vida, ela deve ser valorizada. Foi assim ao longo dos tempos; é assim hoje. Os verdadeiros sábios não dizem a verdade por aí. Mesmo que dissessem, não seriam ouvidos porque a esperança é um câncer. Eles sabem disso e por isso se calam. O Xerife Morrison pensa nessas coisas enquanto degusta o seu uísque sem gelo. 
— Ok, Xamã. Acho que você já serviu de exemplo tempo suficiente.

Um comentário:

  1. Espinosa afirma que "não há esperança sem medo, nem medo sem esperança". Se retiramos a dúvida, a esperança se torna segurança, e o medo se torna desespero. Assim, é humano ter dúvidas, pois são elas que nos levam ora à esperança, ora ao medo. Outro aspecto à ser considerado estaria em Sartre ao propor que podemos "modificar o mundo"? Que podemos viver como se o mundo não estivesse suscetível a processos deterministas? Literalmente em suas palavras: "Em suma, na emoção é o corpo que, dirigido pela consciência, muda suas relações com o mundo para que o mundo mude suas qualidades. Se a emoção é um jogo, é um jogo no qual acreditamos" Trecho extraído do artigo Esboço para uma teoria das emoções, de Jean Paul Sartre. PARABÉNS, PAUL LAW....excelente trabalho reflexivo..oportunidade para (re)pensarmos aspectos elevados do existir nos dias atuais!!!

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