O título desta postagem refere-se ao meu conto que foi publicado na revista Varal do Brasil de dezembro. Para quem quiser conferir toda a revista é só clicar aqui. Agora transcrevo o conto na íntegra.
O natal de Helena
O cavalo disparou pela estrada barrenta daquele sítio distante. Em seu dorso, a jovem Helena tinha os olhos cheios d’água, tal qual o céu daquela noite. Era difícil para ela, era impossível passar a noite de natal sem seus pais, era a primeira sem eles.
“droga”
O cavalo tinha o cemitério como rumo certo, ainda que fosse tarde demais. As águas que caiam devagar do céu, atingiam o rosto pálido da menina de sete anos com agressividade, o animal que a conduzia ia veloz.
Entrou na cidade de Neo Texas, deserta àquela altura da noite e rumou para a Rua Alta, o destino de quem não dispunha de vida. No alto, cercado de grama, árvores secas e cruzes se faziam aterrorizante. O cavalo parou depois de ter as rédeas puxadas com violência pela pequena amazona. Ela desceu e foi até o túmulo dos pais.
“Acho que eu deveria ter apertado aquele gatilho, quando tive a chance. Eu tinha que estar aqui, junta de meus pais porque é muito difícil ficar sem eles. O Billy é um bom homem, mas não é meu pai.”
A criança sabia onde estavam os túmulos dos pais, havia ido até lá várias vezes, tinha o hábito de falar com eles, de jurar vingança. Esta noite o motivo da visita era outro, de saudade. Ela se aproximou, sentou no túmulo de pedra da mãe:
“Mãe, eu tô com saudade. Não sei se serei forte o suficiente para vingar a senhora e o papai. Desde que perdi você, vivo com um homem chamado Billy que cuida de mim e me ensina a ser forte o suficiente para me vingar, vocês sabem. Nessa noite de natal, Billy não fez nada de especial, nem um presente comprou para mim, o que me deixou muito triste porque é o primeiro natal que passamos juntos. Ele não é como a senhora ou papai que sempre me encheram de presentes e festa nesta época do ano. Quando saí de casa, ele já estava dormindo.”
A menina dizia com os pensamentos. Tinha certeza que a mãe podia ouvi-la assim.
“O natal é tão importante, não é? A senhora sempre dizia. Se eu tivesse uma arma eu já teria ido para onde vocês estão, para comemorarmos o natal como antes, como uma família.”
Helena ouviu o barulho de cascos. Alguém se aproximava e ela sentiu medo. Depois imaginou que talvez fosse um bandido mandado por sua mãe, para levá-la naquela noite, afinal tinha pedido.
— Que faz aqui a esta hora? — era Billy.
— Vim ver meus pais nesta noite de natal. — ela enxugou as lágrimas, Billy não gostava de vê-la chorando.
— É perigoso montar por aqui, Helena.
— Como se você se preocupasse comigo.
Fez-se silêncio. Billy acendeu um cigarro e Helena disse-lhe:
— Pode ir embora. Eu vou para casa logo.
— Trouxe-lhe um presente.
Os olhos da pequena Helena brilharam.
— O quê?
— Isto — ele enfiou a mão no coldre e retirou um revólver 38 — Ele é mais leve que os tradicionais, tem cabo de marfim. É uma ótima arma. Feliz natal, guria.
“Era o que eu mais queria.”
— Obrigada.
— De nada. — Billy deu a volta com seu cavalo e cavalgou para a saída daquele cemitério.
Helena sorriu ao fitar a arma pequena, ele gostava dela. Abriu o tambor e viu que estava carregada, confiava nela. Levantou-se do túmulo da mãe com um sorriso no rosto.
“Obrigada, mamãe.”
No dia seguinte, quando o cacarejar das galinhas acordou a pequena Helena, ela fitou o presente que descansava em cima do rústico criado-mudo. Sorriu. Levantou-se ligeira, fez sua higiene matinal e desceu as escadas de madeira do casebre de Billy. Sentiu o cheiro de frango sendo assado e notou que o tutor estava na cozinha, preparando algo.
Quando a curiosidade foi maior, Helena adentou pela porta e viu uma mesa bem arrumada, Billy preparava o banquete natalino. Lágrimas se ajuntaram nos olhos da criança quando ela ouviu o homem:
— Feliz natal, Helena!