Alguns diziam que ele havia perdido o equilíbrio e caído. Outros, que tinha sido agredido por ladrões ao tentar reagir ao assalto. Uma ou outra versão não mudava o fato de estar morrendo. Ali, cercado por curiosos com seus importantes aparelhos de mão, tinha suas derradeiras convulsões. Uma discreta poça de sangue circundava sua cabeça. Era um homem íntegro, pai de cinco filhos, trabalhador. Sublime sabia disso e por isso não podia interferir. Ninguém pode. Os seus milhares de anos lhe deram a certeza de que há um mecanismo complexo gerindo os seres vivos. Brechas? Falhas ou como é mesmo o termo da moda? Bugs? Impossível.
Aproximou-se do homem contorcido. Acariciou-lhe os cabelos.
— Você é um anjo? — perguntou o homem que não sabia como podia falar.
— Sou o que você acredita que sou.
— Promete cuidar dos meus filhos? Da minha esposa?
— Você acredita que eu posso fazer isso?
Ele sorriu e morreu.
Acordou. Um pesadelo. Não iria ao mercado naquele dia.
Uma noite qualquer. Um orfanato. A pequena menina ruiva terminou sua oração com um amém. Outra menina, negra, aproximou-se:
— Como você conseguiu? — ela indagou à primeira.
— Ninguém estava vendo e ele acreditava que fosse possível.
— Sublime, Sublime, se te pegam quebrando as regras!
— Nenhuma regra foi quebrada, Bélica. Para eles não há diferença substancial entre sonho e realidade. Isso já estava assim antes da nossa chegada. Eu apenas troquei um pelo outro e o homem vive.