14 de outubro de 2016

Meio Sol Amarelo de Chimamanda Ngozi Adichie


Outra história

A escritora nigeriana Chimamanda Ngozi Adichie já falou do perigo em conhecer apenas uma história. Explicou como os livros que tanto gostava de ler contavam vidas tão alheias a sua. por este motivo, ela decidiu contar outra história. Uma que pudesse ser reconhecida por seus pares, por seu povo. Este livro é uma outra história e é preciso que se diga de uma vez: é uma história fascinante. 

Meio Sol Amarelo relata os dias de guerra civil ocorridos na Nigéria entre os anos 1967 a 1970. Na ocasião, uma nova República foi fundada dentro do país, cujo nome foi Biafra e foi formada em sua maioria pelo povo Igbo. Neste cenário se desenvolvem três histórias: a de Ugwu, de Olanna e a de Richard. O primeiro personagem é um jovem igbo que sai da sua tribo para ser empregado de um professor universitário, o que lhe garantirá um teto e alimento pelo resto da vida. Olanna, por sua vez, é filha de um rico empresário, mas não tem interesse nos negócios do pai. Seu desejo é casar-se com o professor Odenigbo, o patrão de Ugwu. Richard, por fim, é um jovem escritor inglês que está no país em busca de uma boa história. Ele se apaixona pela irmã gêmea de Olanna, Kainene. Consegue ver como as histórias se articulam? 

As três tramas se desenvolvem em bom ritmo e se completam. Personagens que num primeiro momento são tidos como secundários, como é o caso de Kainene, vão ganhando mais importância ao longo da história e outros, no entanto, vão saindo de cena (é o caso do inglês escritor). O impacto da guerra pode ser observado em todos os personagens, ao passo que as consequências deste impacto são trabalhados com exatidão pela escritora. São humanos... 

Há um fato envolvendo a história dos três personagens que é mantido em segredo por boa parte da trama. Há surpresa quando ele é revelado, mas a quebra de ritmo da narrativa neste ponto é brusca. Não há harmonia com o texto de até então, embora possa ser estratégico com o objetivo de manter o segredo por mais tempo.  

Um ponto a ser destacado é a ótica utilizada na obra. Presume-se que a guerra seja observada do ponto de vista dos líderes políticos ou soldados. Há ainda a possibilidade de ser contada do ponto de vista da população envolvida no conflito, o que geralmente é feito através de narrativa focada na pobreza agravada pelo conflito. Em Meio Sol Amarelo, você pode esquecer qualquer dessas visões. A história se desenvolve do ponto de vista dos nigerianos ricos e inteligentes. É uma experiência singular.

A fome, a morte e demais crueldades advindas da guerra são coadjuvantes nas páginas concebidas por Chimamanda. Ela escapa do óbvio mais uma vez, oferecendo uma leitura mais dramática, ao invés de algo exagerado. A força das personagens (que em muitos casos não acreditam em si mesma) ao lidarem com os problemas é louvável. Em contrapartida, os fortes de até então, ao lidarem com a desilusão, tornam-se vencidos. Mais uma vez, humanos...

Em resumo, Meio Sol Amarelo é um relato autêntico do quanto a mente humana é alterada pela guerra, da inversão de valores causada pela situação emergencial. O quanto vale um prato de arroz (sem qualquer outro adorno) vai depender muito do tempo em que se passa sem saboreá-lo. Um livro intenso, articulado, capaz de emocionar em vários momentos, cujo legado pode ser o de que há vida em outros lugares, mesmo que a maioria das pessoas (ou aqueles que contam histórias) não se dão conta disso. Esta é uma outra história e fiquei satisfeito por conhecê-la.

Fica a resenha e a dica.
Abraço.  
      

        

  

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