5 de junho de 2014

Conto: Serial Killer

 

Todo mundo sente medo, isso é uma verdade. Saber o que fazer com ele é que diferencia uma pessoa da outra; saber usá-lo. Eu sou um cara muito simples e não fico preso à filosofia. Eu atiro mesmo, mas com estilo. As vezes corto e o meu padrão é não ter padrão. Voltando a questão do medo, eu o pego e comparo com os das outras pessoas, geralmente mulheres. Daí, eu ganho.
Todo mundo quer saber o que se passa na cabeça de alguém que mata. As pessoas se preocupam mais com o porquê do que com o sofrimento da família do cadáver. Então, nós do ramo, somos importantes. Não vou mentir que faço com estilo para que observem e admirem. Me conforta saber que pelo menos eu, pensei com carinho no cadáver. Quer saber? Eu sou bom mesmo.
A mulher á minha frente virou os olhos. Ela me acha um babaca, eu sei. Não acredita em nada do que estou falando e a graça de tudo está aí. Quando eu disse que era um Serial Killer e que ia dar uma entrevista exclusiva para ela, tenho certeza que ela não imaginou isso. Não vejo seguranças nem policiais, mas estamos sendo filmados e ela se sente segura, eu me sentiria também. É um desafio.
— O senhor já matou quantas pessoas? — ela me pergunta.
Eu não vejo a questão por esta perspectiva. Números não me fazem bem. Já reparou que as pessoas possuem impulso por numerar tudo? Quanto de dinheiro você tem? Quantos amigos? Irmãos? E carros? Quantos você já matou? São sempre perguntas numéricas e as respostas também exigem números. Eu me recuso a responder com números; prefiro adjetivos, embora aqui sirva um advérbio. Para a questão uso “muitas”.
Ela desdenha.
— Não pode dizer o nome de uma vítima? Um local?
Você já começa a pergunta com “não”. Quer uma resposta negativa, mas eu sou avesso ao que querem.  Posso, claro. 
— Quem?
Você.
A plateia e a animadora riem. Eu também. Ela se levanta para fazer um mercham. Chama os comerciais e fora do ar me indaga:
— Acha mesmo que está convencendo alguém de que é um assassino em série? Faça-me um favor!
Eu não preciso convencer ninguém. Ela se senta, zonza. A plateia observa, os médicos da emissora entram e no rebuliço eu desapareço, mas sei contar o que aconteceu. Eu tinha planejado tudo.
Eis aí o que eu tinha falado inicialmente sobre o medo. É tudo uma questão de o que fazer com ele; de como nos defendemos ou ficamos desatentos por causa dele. A apresentadora estava tão cética de que eu era uma fraude que esqueceu seu copo d’água perto de mim. Deve ter sido um espetáculo e tanto que quase valia ser preso para assisti-lo. Minha esperança é que a gravação vaze…

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