14 de junho de 2018

Capítulo 7 - V de Verônica

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Os dias que se seguiram na penitenciária feminina foram mais calmos. Vou explicar o motivo. Rita me contou que a notícia de minha existência e prisão se espalhou rapidamente, o que trouxe atenção ao local em que estou “hospedada”. 
As presas que me agrediram tiveram que ser transferidas de pavilhão e Gilda estava respondendo a uma sindicância. A carcereira comentou, ainda, que a diretora podia ser afastada a qualquer momento por ter feito vista grossa ao canivete de minhas agressoras. Rita chegou a comentar que suspeitava que a própria diretora tinha pedido às presas que me testassem. 
O estabelecimento prisional foi visitado por entidades reguladoras, as condições dos presos revistas e adequadas. Até mesmo a minha. Eu já tinha uma cela exclusiva, mas ganhei colchão e papel higiênico, além de livros para leitura. Como havia me habituado em liberdade, passei o tempo nas páginas, esquecendo-me da triste realidade. 
Nos banhos de sol, eu estava algemada nos pés e nas mãos. Até mesmo em minha cela, as algemas de tornozelos se faziam presentes.
Gilda aparecia nas grades de minha cela em seus plantões e me contava alguma coisa do que estava acontecendo lá fora.  Aproveitava para dar sua versão sobre minha condição. 
— Você tem sorte. Todo mundo está de olho, até parece que preso voltou a ser gente.
— Preso é gente — vociferei. 
Ela deu de ombros, respondeu: 
— De todo jeito, vamos ver até onde você vai. Lembra-se do que te disse no primeiro dia? Eu quero ver até quando consegue sobreviver.
Ainda bem que eu tinha o livro, pois as presas não se aproximavam de mim. Elas tinham medo, explicou-me Benedita, a outra carcereira. Medo de que eu revidasse ou de que fossem transferidas. 
Eu ansiava por uma visita, qualquer uma, fosse Felipe para me pedir desculpas, fosse Valéria para me tirar de lá ou Meire, para me levar a outra audiência. Entretanto, elas não vieram, mesmo o grande volume de pessoas nos dias de visita dizendo o contrário. 
As pessoas até queriam me ver, mas não podiam. 
Então, num dia que não era reservado a visitas uma equipe de TV apareceu. Sim, foi desse jeito que eu conheci Marcelo Siqueira, o jornalista que me descobriu. Ele era o homem com o microfone na mão que se aproximou do corredor de celas dizendo que mostraria em primeira mão o primeiro super-herói da história. 
Eu o odiei imediatamente. 
Era um homem alto, de pele clara, olhos castanhos e barba bem cuidada. Os cabelos penteados para trás, lisos, fixados por gel. Vestia um terno fino, tinha uma barriga sobressalente. Vinha acompanhado de um cinegrafista. 
— Mostra aqui! — foi a primeira coisa que ele disse, referindo-se a mim. 
Eu encarei a câmera com aborrecimento. Afastei-me das grades. Marcelo me disse:
— Sou Marcelo Siqueira da TV Local, como vai? O público quer saber como você conseguiu seus poderes. 
Eu não lhe respondi. Ele continuou falando de mim, do processo e de sua opinião sobre minhas atitudes. Insistiu mais uma vez por uma declaração, que recusei. Falou:
— Bem, gente, ela não quer falar. É uma pena, já que a população gostaria de saber por que ela não ajuda as pessoas.
— Você não sabe nada sobre mim! — respondi, irritada. 
— Estou escrevendo um livro a seu respeito.  
— Como você me descobriu? 
Ele sorriu com vontade e fez um sinal para que a gravação fosse interrompida. Aproximou-se das grades e me contou, triunfante:
— Explica uma coisa: se estava tentando se esconder, por que fez exame de sangue no Hospital Municipal?
— Então foi assim que fui descoberta... 
Eu sabia do que o repórter estava falando. Foi numa manhã no Hospital Municipal e aconteceu por insistência de Felipe. Ele teimou que eu deveria realizar exame de sangue para saber a tipagem, a fim de evitar o problema do fator RH caso tivéssemos filhos. Eu tentei convencê-lo de que não era preciso realizar qualquer exame; disse que tinha medo de agulhas ou qualquer coisa parecida, mas pouco convincente. Isso o deixou cismado. Com a minha recusa confessou-me que achava que sua namorada estava escondendo algo. Estava mesmo, mas não o que ele imaginava; não uma doença, bem talvez uma doença, mas não o que ele pensava que fosse. No fim, cedi e realizei o exame, cujo resultado, soube dias depois, foi normal e minha tipagem sanguínea deu para AB. 
— Tenho contatos no laboratório do hospital, sabia? Eu farejei uma boa história, assim que minha fonte me falou sobre células com propriedades incríveis. 
— Você arruinou minha vida! Eu não sou uma criminosa! 
— Acha que isso importa? Parou para pensar no que está em jogo aqui? Eu sou só um cara que apresentou fatos contundentes sobre um ser com a capacidade de se regenerar instantaneamente, o que aconteceu depois não tem nada a ver comigo.
— Você começou com tudo isso! A culpa é sua! 
— Escute, estou faturando com o que descobri, nada mais justo. Consegui um emprego na televisão e quer saber? Ninguém liga se é verdade ou não. Eles querem notícia. Você pode ficar calada, pode responder as minhas perguntas, tanto faz. O que importa é o que eu farei depois com as imagens que consegui aqui. É assim que as coisas funcionam, Mulher-Maravilha. 
— Você é sujo! 
— Obrigado — Marcelo Siqueira fez uma reverência. 
Pigarreou e se voltou para o cinegrafista. Disse:
— No três voltamos a gravar. Um dois...



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