6 de janeiro de 2022

Demônio Famoso



Famosa entra no palco. Traja roupa similar a de Benjamim, mas o rosto está com maquiagem de palhaço. Os cabelos dourados embaraçados. Ela caminha de um modo estranho, imitando passos de um homem desengonçado. Para próximo a cadeira em que o velho Benjamim está sentado. 

— Olá, como vai? Eu sou uma atriz e o meu personagem é um rapaz que passa a maior parte da peça sentado em uma cadeira. 

— Ora, quem quer enganar? És Famosa, a princesa que me quis como esposo em atos passados. Acha graça em me imitar? 

— Todos nós encenamos! Sou ela, sou ele, tanto faz. Meu objetivo ainda é claro, Benjamim. Eu quero ser lembrada. Quero ter uma biografia extensa, vários maridos, mansões, papéis notáveis. Quando o último dia chegar que seja anunciado em todos os lugares; que os meus fãs encham o velório; bandeira a meio mastro; luto oficial. O que vão falar de você depois que se for, já passou pela sua cabeça?

— Bem, eu não vou mentir. Já pensei. 

— Pois então, como quer ser lembrado? Não me venha com essa história de um menino e sua cadeira. Eu cogito coisas grandiosas para você. Digo isso sem nenhum ressentimento por não ter sido a escolhida, pois sei que se você for inesquecível, serei também. Raciocine comigo, vamos! Que tal ali jaz Benjamim o personagem pensante; aquele que se rebelou contra a história e criou o seu próprio destino; que estabeleceu casa num teatro, contratou atores e brincou de diretor e personagem. Um espécime único! 

— São suas palavras não minhas. Elas não contradizem o fato de eu ser o menino em uma cadeira.


Trecho do livro Respeitável Benjamim

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